São justificadas as críticas ao texto da reforma tributária aprovado na quarta-feira pelo Senado. De fato, o conteúdo votado restou bastante alterado em comparação à proposta original que começou a ser discutida no Congresso. Ao longo da tramitação e das negociações, deputados e senadores incluíram uma série de exceções e regimes especiais que diminuem a potência da alteração do sistema. São benefícios para determinados setores que elevam a alíquota-padrão do futuro Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
Mesmo com todos os defeitos, a reforma ainda é amplamente benéfica para o país
Todos os reparos feitos até aqui, no entanto, de forma alguma obliteram as vantagens de se abandonar a desordem em vigor. A complexidade vigente, de caráter regressivo, com impostos cobrados sobre outros impostos e incontáveis alíquotas diferentes em Estados e municípios, entre outras disfuncionalidades, onera e retira competitividade da economia nacional, além de gerar contenciosos administrativos e jurídicos em massa. A simplificação que virá com a unificação de tributos sobre o consumo trará mais justiça social, transparência, fim da cumulatividade, impedimento para o aumento da carga e contribuirá para a produtividade. É desnecessário entrar aqui em minúcias técnicas e números, já explicados de forma didática na profusão de reportagens produzidas sobre o tema nos últimos meses.
Deve-se ter ainda a perspectiva de que há cerca de 30 anos o Brasil vê sucessivas tentativas de aprovar uma reforma tributária fracassarem. Exatamente pelas diferentes visões regionais e de setores da economia, que pareciam incontornáveis. Felizmente para o país, construiu-se agora o consenso possível, conciliando diferentes posições de economistas, governo federal, Congresso e segmentos afetados. É um feito histórico, portanto.
A veracidade da afirmação de que tem boa distância do estado da arte desejado não anula os ganhos da reforma. Seria esperado que diferentes interesses se mobilizassem para garantir vantagens e evitar possíveis perdas, influenciando a atuação parlamentar. Note-se que, a despeito de toda sorte de concessões, o texto teve apenas quatro votos a mais do que o necessário para ser aprovado no Senado.
A reforma tributária é um avanço estruturante para o país. Vai melhorar o ambiente de negócios e a atratividade de investimentos. Mas não significa o fim dos problemas da economia brasileira. A aplicação será gradual, com uma transição longa e ainda há outras agendas importantes à frente. Nem é jogo jogado, como se diz na gíria do futebol. Como o texto aprovado no Senado foi modificado em relação ao votado na Câmara, volta para ser reanalisado pelos deputados federais. É preciso ainda manter a marcação cerrada para evitar a ampliação de benefícios localizados. Após a promulgação, muitos pontos ainda serão definidos por lei complementar, caso da alíquota-padrão. Espera-se que não passe de 27%, o maior percentual praticado entre os países que adotam o modelo do IVA. Ainda será essencial, portanto, máxima atenção da sociedade para evitar novos desvirtuamentos.
Mesmo com todos os defeitos, a reforma ainda é amplamente benéfica para o país. O sistema atual, também chamado de manicômio tributário, será substituído por uma estrutura racional e globalmente consagrada.