Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro vetou o reajuste do valor a ser repassado pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que havia sido aprovado pelo Congresso Nacional e constava na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Na prática, Bolsonaro escolheu não corrigir o valor que é repassado para escolas públicas oferecerem alimentação para quase 40 milhões de crianças e adolescentes. Esse valor está congelado há vários anos – para se ter uma ideia, a Folha apurou que, entre 2014 e 2019, houve redução de 20% no valor do orçamento em termos reais. Hoje, para cada criança na pré-escola, o valor repassado é de R$ 0,53; para aqueles no Ensino Fundamental e Médio, o valor é de R$ 0,36, e para creches, R$ 1,07.
Por muito tempo, o Brasil foi exemplo na organização dessa rede, que deve fornecer alimentação de qualidade para as pessoas que mais precisam
A justificativa do veto foi pró-forma: estaria em desacordo com o interesse público, pois enrijece o orçamento e compromete outros gastos. Importante registrar, no entanto, que se trata do mesmo governo que promoveu um decreto completamente extemporâneo de situação de emergência para aprovar a distribuição de benefícios, sem qualquer planejamento, em período eleitoral.
Ou seja, este veto no reajuste do PNAE é mais um atestado de que políticas de assistência social não estão no escopo de planejamento do governo federal. Não temos ações organizadas e pensadas em um contexto macro. A insegurança alimentar que assola o Brasil necessita mais do que incrementos de transferências de renda (datadas até dezembro, aliás) para ser debelada. É urgente que a rede de abastecimento alimentar volte a ser organizada.
Por muito tempo, o Brasil foi exemplo na organização dessa rede, que deve fornecer alimentação de qualidade para as pessoas que mais precisam. O PNAE transfere recursos para compra de alimentos e também regula essa compra, exigindo, por exemplo, que se adquira alimentos da agricultura familiar. Da mesma forma, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que foi rebatizado como Alimenta Brasil, e que também viu seu orçamento minguar, é responsável pela aquisição de alimentos e doação para instituições e pessoas cadastradas.
Então, está claro que é urgente reorganizar a rede de abastecimento alimentar no Brasil – a começar pelo seu orçamento. Merenda é mais do que bolacha no recreio, é uma política altamente focalizada e efetiva de combate à fome. Temos muita gente com fome, muita criança estudando com fome. Quem tem fome tem pressa... e dependo do Estado.