Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
Estamos enfrentando uma crise econômica que tem contornos muito mais dramáticos do que a famosa crise de 1929. Isso, porque a causa central do que estamos enfrentando agora não é econômica, mas de saúde. Todas as economias do mundo estão sendo testadas no seu poder de reação. Seja em termos de potencial fiscal para bancar os mais diversos auxílios ou na engenhosidade dos planos de retomada, todos navegamos em águas turbulentas e seguidamente prejudicados pela neblina.
O nosso inimigo é uma infecção viral para a qual não existe vacina e nem cura. A área da saúde, neste contexto, está sendo desafiada a responder à pandemia em várias frentes. Uma delas, é indicar qual a melhor estratégia para manejar o contágio. E a resposta para a maior parte dos países tem sido que o distanciamento (ou isolamento) social é a melhor opção. A área da economia e negócios é chamada a administrar os impactos, diretos e indiretos, deste isolamento e também do próprio sistema de saúde.
E a partir deste momento se constrói a ideia de que haveria uma competição entre economia e saúde. De um lado, profissionais da saúde defenderiam que salvar vidas está acima de qualquer questão econômica. De outro, profissionais da economia e negócios defenderiam que é preciso estancar a crise e fazer algumas contas de custo-benefício equiparando emprego e vidas através de unidades monetárias.
Na minha avaliação, quem se fecha em qualquer um destes lados não entendeu a dimensão do problema. Exigir quarentena absoluta (lockdown) por 6 meses me parece tão insensato quanto fazer uma conta de quantos morreriam em caso de abertura total para saber se o custo seria menor do que o da quarentena. Se a realidade é complexa e multidisciplinar, a solução também deve ser. Não se trata de ceder ou compor, mas construir conjuntamente.
A única forma de fazermos isso é sendo absolutamente intransigentes no respeito ao papel da ciência. A ciência é compartimentada em áreas, claro. Mas, quando os problemas a serem atacados são multidimensionais, não é possível apenas isolar infectologistas em laboratórios e economistas em escritórios e depois compartilhar relatórios. A construção precisa ser conjunta do início ao fim. O trabalhador que fica doente é o que não produz; o que não produz ficando em casa, não fica doente. Não se trata de disputa, mas de um equilíbrio delicado e absolutamente científico.