Somos tão antissociais que agora vamos começar a pagar para não conversar.
Que coisa, essa notícia de que os clientes da Uber terão à disposição uma modalidade que silencia o motorista. Isso mesmo: a partir do final de novembro, mediante o pagamento de um dinheirinho a mais, você poderá deixar claro que não está a fim de papo antes mesmo de o carro chegar.
Puxa vida: se não quer falar com o motorista, basta ficar quieto, afundar a cabeça no smartphone ou, o que seria o mais educado, dizer a ele "olha, não me leve a mal, mas hoje não estou a fim de papo".
Já andei com motoristas calados, já andei com falastrões, já andei com integrantes do Clube do Ódio. Faz parte, ao meu ver, da vida em sociedade. Encaro como um exercício de paciência, ou mesmo de empatia – é bom saber como os outros, os que não estão na nossa bolha, pensam.
Mas também já tive a sorte de empreender conversas muito legais, produtivas, divertidas e até comoventes. Certa vez, peguei um motorista que conhecia e havia trabalhado com o saudoso Guto Greco, que tinha sido nosso professor no Laboratório de Criação, na Fabico (a Faculdade de Jornalismo da UFRGS), nosso diretor do grupo teatral que montamos em meio às aulas e nosso amigo com quem viajamos para festivais e passeios de feriado. Para chegar a esse assunto, que trouxe emoção para os dois lados, só o que precisamos fazer foi conversar, interagir, demonstrar interesse pelo outro, compartilhar um pouquinho de vivência naquela corrida que nem chegou a 10 minutos.
Enfim: cada vez pagamos mais para não lidar com a vida como ela é, cheia de imprevistos, chateação e frustrações, mas também de surpresas, reencontros e a satisfação gerada da cumplicidade de um sorriso, aquele momento gostoso em que, com o humor renovado, motorista e passageiro se despedem.