Ao mesmo tempo que deve aplaudir a Polícia Civil pelo desmantelamento de uma das maiores quadrilhas de roubos e furtos de veículos do Estado, a sociedade gaúcha tem motivos de sobra para preocupação. Como pode uma organização criminosa ter se infiltrado a tal ponto na vida econômica e social, utilizando-se de fachadas para disfarçar atividades ilegais, sem que o sistema governamental tenha embaraçado a desenvoltura da quadrilha? Enquanto os cidadãos honestos enfrentam enormes dificuldades burocráticas para empreender em meio a um emaranhado de leis, normas e regras, os criminosos montavam seus "negócios" e agiam com a tranquilidade de quem tinha a convicção de que nada lhes aconteceria.
É notória a dificuldade dos órgãos públicos de punir receptadores e cúmplices dessas quadrilhas que ensanguentam e aterrorizam a sociedade gaúcha. Quando as autoridades de segurança conseguem cumprir com o seu papel, resta à sociedade torcer para que a lei se cumpra, com a apuração de responsabilidades e a punição dos criminosos. Ao mesmo tempo, situações como essa se prestam para uma reflexão sobre as consequências provocadas por quem, de alguma forma, contribui para fomentar os crimes atribuídos à quadrilha. Não raramente, quem age dessa forma ainda se vangloria de estar levando vantagem.
No caso do esquema desfeito pela chamada Operação Barão, chama a atenção, de saída, a quantidade de pessoas envolvidas, em um amplo raio geográfico de atuação, que se estendia a vários Estados. Além disso, o número de crimes praticados é elevado, com tentativas de fraude até mesmo contra o Judiciário. Montada sob a forma de empresa, uma operação criminosa com essa estrutura só subsiste porque há mercado para veículos roubados, muitas vezes na base de atos que provocam danos físicos e psicológicos irreparáveis aos proprietários, e para autopeças revendidas em lojas virtuais ou em redes clandestinas.
O Rio Grande do Sul espera que o esforço da Polícia Civil, com a mobilização de alguns de seus melhores e escassos recursos durante meses, não se esvaia na libertação prematura dos criminosos por meio de filigranas jurídicas. Esse é o tipo de atitude que só faz crescer a indignação popular e, perigosamente, tende a inspirar soluções fora dos padrões do Estado de direito para se combater e vencer a criminalidade.