Neste momento atípico da realidade política brasileira, o país precisa ter consciência da necessidade de preservar instituições como a Polícia Federal. Ao se manifestar sobre o conteúdo de uma apuração em andamento envolvendo o presidente da República numa investigação na área de portos, o diretor-geral da instituição, Fernando Segovia, constrangeu o delegado responsável pelo inquérito. Diante do inusitado, que foge ao padrão de seus antecessores, é natural que se multipliquem declarações contundentes, a maioria contrária à opinião manifestada. Ainda assim, mesmo uma inédita manifestação como essa, sem precedentes na história da entidade, não pode ser usada como pretexto para enfraquecer instituições, que estão acima disso.
As inoportunas declarações de Segovia podem "caracterizar infração administrativa e até penal", como advertiu o ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). Além disso, um eventual pedido de arquivamento do inquérito, como sugeriu o diretor-geral, teria que partir da Procuradoria-Geral da República, que solicitou a investigação.
Episódios como esse reafirmam a importância de não se perder de vista que Polícia Federal é um órgão de Estado, com uma atuação que deve se pautar sempre por critérios técnicos, sem ingerências políticas. A entidade não está a serviço dos interesses de quem eventualmente se encontra no poder. Seus integrantes precisam de autonomia e isenção para executar seu trabalho. Os responsáveis por seu comando acertam mais quando têm consciência do valor do silêncio, padrão que até agora vinha sendo seguido à risca pela instituição.
Ainda assim, independentemente de inadequações cometidas por seus dirigentes e integrantes, que precisam ser enfrentadas e corrigidas, organismos responsáveis pela apuração de denúncias têm se destacado pelo exemplo de retidão no combate à corrupção. Vale o mesmo para o Ministério Público e o Judiciário. Excessos e equívocos em investigações precisam ser apontados e enfrentados. Não podem, porém, servir como instrumento para quem tem como objetivo predominante desmoralizar o combate à corrupção, e não zelar pelo comportamento de homens públicos.