
Pela segunda vez em poucos meses, o presidente Michel Temer utiliza a palavra "acidente" para definir ocorrências que nada têm de acidentais – e que certamente mereciam uma interpretação mais realista do comandante do país. Em janeiro, ele disse que o massacre de 60 presos numa cadeia de Manaus foi "um acidente pavoroso". Na ocasião, depois de receber muitas críticas pela escorregadela verbal, ainda tentou justificar o equívoco, publicando numa rede social vários sinônimos para a palavra mal empregada. Agora, em entrevista concedida à agência espanhola EFE no último sábado, Michel Temer assegurou que investidores nacionais e estrangeiros não vão parar de investir porque houve "um acidente desta ou daquela natureza, uma delação de alguém".
Ora, a corrupção não é um acidente. As delações da Odebrecht e todas as demais conhecidas no contexto da Operação Lava-Jato nada têm de acidentais. Resultam, acima de tudo, de condutas voluntárias de governantes, parlamentares e empresários responsáveis pela maior roubalheira de dinheiro público de que se tem notícia no país. Os investidores estrangeiros e também os nacionais certamente se preocupam com isso, sim, até mesmo porque a própria governabilidade está ameaçada pelas investigações.
Se há algo que não pode ser minimizado neste confuso país, é essa operação de combate à corrupção. O Brasil precisa, sim, dos investimentos que ajudarão nossa combalida economia a se recuperar. O governo Temer está dando uma contribuição importante nesse sentido, com uma equipe econômica competente e bem-intencionada, que vem fazendo um grande esforço para não ser contaminada pelas mazelas políticas.
Neste contexto, a palavra acidente soa totalmente inadequada, por mais sinônimos que se procurem para justificá-la.
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