Por José Ricardo Lira Soares, procurador regional da República na 4ª Região
O último 26 de março não terminou, continuará por todo 2025. Foi quando o Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra oito pessoas cujos atos encontraram epílogo na depredação das sedes dos três poderes, em 8 de janeiro de 2023, em Brasília.
No final de março, o poder civil restaurou sua prevalência sobre o golpismo
Elio Gaspari, no terceiro volume do indispensável pentateuco sobre a ditadura militar (1964 - 1985), narra o episódio da exoneração do ministro do Exército Sílvio Frota pelo então presidente da República Ernesto Geisel (capítulos “Um dos dois vai ter que sair” e “Um saiu”). Geisel livrou-se do insubordinado Frota e, após 13 anos de ditadura, restaurou a autoridade da Presidência sobre as Forças Armadas, determinante para a abertura política que encerraria aquele regime em 1985.
Ao que me consta, pela primeira vez na história da República, o ministro do Exército foi afastado pelo chefe do Estado por participação em quartelada. Traça-se aqui um paralelo: no final do último março, o poder civil – aqui, pelos atos do MPF e do STF – restaurou sua prevalência sobre o golpismo. Fê-lo ao tornar réus oito golpistas de alto coturno, dentre eles um ex-presidente da República e quatro oficiais-generais quatro-estrelas.
Mais de 47 anos intermedeiam os fatos. Aquele chegou a seu propósito, a imposição da candidatura do general João Figueiredo à Presidência, fiadora da abertura lenta e gradual proposta por Geisel. Este, nos incunábulos, para que chegue a bom termo, é mister continuar a prolação de votos estritamente técnicos pelos ministros do STF, como os proferidos na sessão que recebeu a denúncia do MPF. Também sejam asseguradas aos réus as garantias fundamentais da amplitude de defesa, do devido processo legal e da presunção de inocência.
E a democracia, o princípio norteador da Constituição (não apenas livro, ou lei, ou palavra “do pântano enganoso das bocas”, mas o próprio modo pelo qual a nação se constitui Estado), claudicante, mas luminosa, tremeluzente, restará preservada.