Em recente artigo, colunista deste jornal comparou criminosos a lagartos acuados que atacam por não ter outra saída. Ora, seres humanos, mesmo bandidos, não podem ser comparados a rastejantes, pois têm livre-arbítrio para não reagirem como tal. Mesmo em muitos aspectos sendo piores do que os animais, os criminosos devem ser vistos e tratados como seres humanos, especialmente para fins de sanção penal.
É pouco construtivo voltar ao debate de que, se não resolvermos a questão da exclusão social, não teremos segurança pública. Enquanto caíamos nessa esparrela, deixamos de estabelecer medidas de segurança que impedissem que nossas cidades se transformassem em um covil dominado por feras muito mais perigosas do que os lagartos. O aumento da criminalidade, mais do que da piora das condições econômicas, decorre do aumento da sensação de impunidade. Vários indicadores sociais melhoraram nos últimos anos no Brasil e a criminalidade só fez aumentar.
As cidades e países que tiveram sucesso no combate à criminalidade apoiaram-se em polícias e sistemas penais eficientes e na redução do sentimento de impunidade, como a Paris dos anos 60 a 70, Nova York dos anos 80 e mesmo países da América Latina, como a Colômbia.
Acima de tudo, o artigo comete o erro capital de atribuir à sociedade a responsabilidade pelos atos dos bandidos. Gostaria de entender de que forma qualquer professor, profissional liberal, trabalhador ou empresário, trabalhando de sol a sol 10 horas por dia, pagando tributos escorchantes, expondo-se a enormes riscos físicos e financeiros e gerando empregos, estaria excluindo alguém. Na verdade, é o contrário: é a sociedade com seu enorme esforço que inclui e incorpora pessoas que antes se encontravam marginalizadas.
Sociedades capitalistas são muito mais bem-sucedidas na tarefa de incluir do que sociedades menos capitalistas e até mesmo com menor desigualdade social. A carência material não é responsável pelo crime, os criminosos são. Precisamos acreditar no livre-arbítrio das pessoas, sem o qual tudo está perdido. O problema é que estamos imersos em uma mentalidade que livra as pessoas de sua responsabilidade e que nos levará a todos ao fundo do poço. Já levou.