Nesta era de refinadas previsões, uma variedade de algoritmos nos cerca o tempo todo para adivinhar o que podemos comprar, com quem podemos acasalar, e em quem podemos votar nas próximas eleições. Agora, os cientistas sociais estão usando algumas dessas ferramentas para prever quando estaremos propensos a fazer coisas horríveis uns aos outros.
Pesquisadores australianos dizem ter desenvolvido um modelo matemático para prever o genocídio. Um sociólogo suíço vasculhou o equivalente a um século em artigos de imprensa para prever quando teremos guerras - tanto entre países quanto dentro deles. Um laboratório da Duke University desenvolve um software que, em teoria, pode ser usado para prever insurgências. Uma equipe reunida pelo Museu do Holocausto está analisando discursos de ódio no Twitter como uma forma de antecipar epidemias de violência política: o sistema será implantado no próximo ano para as eleições na Nigéria, que são frequentemente marcadas por violência.
O que torna esses esforços tão impressionantes é que eles utilizam técnicas de computação - e algumas vezes enormes quantidades de poder computacional - para misturar todo tipo de dados, do orçamento de defesa de um país e taxas de mortalidade aos tipos de palavras usadas em artigos da mídia e publicações no Twitter.
Nada disso produziu uma bola de cristal perfeita para prever violência em massa - e por boas razões.
- Os eventos são raros; os dados que temos são irrelevantes. Isso transforma a previsão em uma tarefa particularmente difícil, afirmou Jay Ulfelder, cientista político que está desenvolvendo um sistema de alerta na web para prever atrocidades em massa.
Mas os cientistas sociais estão ficando melhores em antecipar onde podem surgir problemas - ou, como afirmou Ulfelder, em avaliar riscos. Isso explica por que a comunidade americana de inteligência vem explorando o campo há anos. O grupo governamental Political Instability Task Force (Força-tarefa de Instabilidade Política, em tradução livre), que Ulfelder ajudou a administrar por mais de uma década, tenta prever quais países têm chances de testemunhar distúrbios civis em curto prazo. Seus dados não são públicos, e nem as informações sobre como o governo usa suas previsões.
Hoje em dia, naturalmente, o rastreamento de dados está basicamente incorporado em nossas vidas cotidianas. A Amazon tenta antecipar o que podemos ficar tentados a comprar com base no que já compramos - ou pensamos em comprar - no passado. O Google tenta prever o que estamos procurando. Partidos políticos nos Estados Unidos e outros países estão criando novas ferramentas para prever em quem podemos votar. E as agências policiais do mundo todo estão cada vez mais se voltando a ferramentas analíticas para prever quando e onde um crime pode ocorrer.
Prever a violência em massa é mais uma fronteira. Entre esses esforços está um projeto de 2012, financiado em parte pelo governo australiano, onde uma equipe da University of Sydney examinou mais de doze variáveis que poderiam apontar a probabilidade de atrocidades em massa: a ocorrência de assassinatos políticos ou golpes; conflitos em estados vizinhos; a existência de uma alta taxa de mortalidade infantil.
Usando ferramentas de aprendizado de máquinas para traçar inferências sobre os efeitos de cada pedaço de informação analisada, os pesquisadores compilaram uma lista dos 15 países com o maior risco de genocídio entre 2011 e 2015. A República da África Central, que não aparecia em nenhum radar na época, apareceu no topo, seguida pela República Democrática do Congo e Chade. Também na lista estavam concorrentes óbvios com conflitos permanentes: Somália, Afeganistão e Síria. Eles não acertaram em tudo: o Sri Lanka estava na lista, mas não vê epidemias de violência em massa desde 2011.
Ben Goldsmith, professor de Governança na University of Sydney que conduziu o projeto australiano, reconheceu que previsões dessa natureza costumam estar mais erradas do que certas, já que, em média, essas coisas terríveis acontecem menos de uma vez por ano desde a década de 1950.
Em alguns casos, um poder computacional maior e mais rápido tornou a previsão possível. Thomas Chadefaux, um sociólogo de Zurique, tenta prever quando e onde haverá alguma guerra. Ele vasculhou notícias, semana a semana, de 1902 a 2011 no enorme banco de dados jornalísticos do Google, e procurou por palavras e frases que significavam tensão: palavras como crise, luta, combate e casco. Ele produziu um modelo matemático que, segundo ele, pode prever a probabilidade de uma guerra entre nações com um ano de antecedência, e dentro de países apenas seis meses antes.
- Uma guerra raramente surge do nada, concluiu Chadefaux.
Kalev H. Leetaru, um cientista da Computação da George Washington University, construiu um grande tesouro chamado Banco de Dados Global de Eventos, Linguagem e Tom. Ele tem percorrido a internet para catalogar notícias de eventos importantes de 1979 até hoje. Ele pode ser usado para estudar o que pode ocorrer no futuro - ou para produzir um resultado instantâneo do que está acontecendo agora, como no caso de um mapa que Leetaru gerou para mostrar epidemias de violência na Nigéria.
O difícil é saber se toda essa adivinhação conseguirá realmente ajudar a impedir a violência. No fim, isso tem mais a ver com o cálculo do poder do que com modelos matemáticos.
Alguns projetos estão tentando implantar ferramentas de previsão em tempo real. Michael Best, professor do Georgia Institute of Technology, ajudou a desenvolver uma ferramenta para as eleições do Quênia, no ano passado, que analisou relatos de violência política no Twitter e Facebook. A Nigéria permitiu que os pesquisadores acompanhem sua central de segurança eleitoral quando os cidadãos forem às urnas no ano que vem: eles irão analisar as redes sociais para discursos de ódio, usando ferramentas automatizadas, e combinar os resultados com as descobertas de monitores da eleição em campo.
O discurso na mídia social não pode apontar precisamente as epidemias violentas, alertou Best, e nem seria ético censurar o que os nigerianos postam online. Entretanto, as palavras são como sinais de fumaça, e ele espera que o trabalho possa ajudar as autoridades a estar no lugar certo na hora certa.
Previsão
Pesquisadores listam países com maior risco de genocídio até 2015
Euipe da University of Sydney examinou mais de doze variáveis que poderiam apontar a probabilidade de atrocidades em massa
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