Dos 102 gaúchos réus por envolvimento nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, sete acusados por crimes graves já foram julgados e condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a penas que variam de 13 a 17 anos de prisão, e pelo menos quatro são considerados foragidos pela Justiça Federal. Todos eles (e um oitavo réu que ainda não foi julgado) são condenados por tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado democrático de direito, associação criminosa armada, dano qualificado e deterioração do patrimônio.
Entre os 102 réus originais, alguns adotaram postura discreta, até pela delicada situação que enfrentam. Outros fizeram da prisão (que consideram política e motivada pelo seu gesto de "patriotismo") uma bandeira eleitoral, como mostra esta reportagem.
Nesta quarta-feira (8), completam-se dois anos da maior onda de distúrbios políticos em seis décadas no país, que terminou com a prisão de 1,9 mil envolvidos — parte deles flagrada dentro dos prédios que eram depredados, e os demais acampados em frente a quartéis, apelando pela derrubada do governo pelos militares. Ao todo, 1.552 pessoas se tornaram rés pelos atos antidemocráticos e 371 foram condenadas. Os processos contra os demais continuam.
No grupo dos gaúchos que mergulharam em um semianonimato está o primeiro condenado pelos atos extremistas, o estudante de Psicologia e microempresário Eduardo Zeferino Englert, 42 anos. Santa-mariense e defensor do ex-presidente Jair Bolsonaro, ele viajou dois dias de ônibus, junto a um grupo disposto a impedir a continuidade do governo Lula. Flagrado no Palácio do Planalto invadido, enquanto o prédio era depredado, o universitário foi condenado pelo STF a 17 anos de prisão e cumpre a pena num presídio regional.
Já outros continuaram na militância política. É caso da santa-mariense Tatiane da Silva Marques, 41 anos, administradora de empresas que ganhou fama após fazer uma live no momento em que estava sendo presa em Brasília, em 8 de janeiro. Virou ré por incitação às Forças Armadas para que cometessem crime. Mesmo assim, decidiu se candidatar a vereadora nas últimas eleições pelo PL, com o codinome de Tatiane Patriota. Não se elegeu. No fim de 2024, foi condenada a pena de serviços comunitários, com uso de tornozeleira. Tatiane já tinha sido anteriormente candidata a deputada federal pelo PSL e a vereadora pelo PL, em Santa Maria, sem sucesso, apesar de obter boa votação.
Outros três gaúchos envolvidos nas manifestações do 8 de janeiro tentaram o cargo de vereador e não foram eleitos. Em termos nacionais, de 35 indiciados pelos atos antidemocráticos que se candidataram nas últimas eleições, três foram eleitos e 14 viraram suplentes de vereador.
Quem sãos os gaúchos condenados por crimes graves no 8 de Janeiro
Jorginho Cardoso de Azevedo, 61 anos
Gaúcho, mudou-se para o Paraná, onde é morador de São Miguel do Iguaçu. Foi preso em 8 de janeiro, flagrado dentro do Palácio do Planalto, junto com a multidão de depredadores. Ficou encarcerado em Brasília por mais de ano. É produtor rural, lida com pesquisa de água mineral e criação de gado. Entre as acusações, está a de que fretou um ônibus que levou manifestantes para os distúrbios em Brasília. Cumpre pena de 16 anos de prisão.
Eduardo Zeferino Englert, 42 anos
Santa-mariense, foi preso no Palácio do Planalto. Condenado a 17 anos de prisão, o estudante de Psicologia está recolhido em um presídio próximo a Santa Maria. Tentará mudança para regime semiaberto quando completar um sexto da pena (possivelmente, dentro de um ano). A defesa dele não quis se pronunciar oficialmente.
Marcelo Soares Konrad, 46 anos, e Jaqueline Konrad, 38
Moradores de São Martinho, cidade perto da fronteira gaúcha com a Argentina, atuam com investimento financeiro e comércio. Depois de ir de ônibus com outros manifestantes até Brasília, o casal foi preso em flagrante no Palácio do Planalto, enquanto o prédio era depredado. Ficaram mais de seis meses em presídios do Distrito Federal. Advogado do casal na época da prisão, Marvius Dornelles Remus admite que eles participaram do protesto, mas assegura que não depredaram nada e que apenas filmaram o que viram. Jaqueline foi condenada a 13 anos e meio de prisão. Marcelo foi condenado a 14 anos de prisão. Enquanto aguardavam recursos, tiveram a prisão decretada e não foram mais encontrados. O advogado diz que não falou mais com eles desde a condenação. Estão com prisão decretada e são procurados desde abril de 2024, conforme o Banco Nacional de Mandados de Prisão do Judiciário.
Miguel Fernando Ritter, 61 anos
Mecânico e sócio de uma empresa que vende peças para lojas automotores, é morador de Santa Rosa. Ele foi detido em flagrante em 8 de janeiro no Palácio do Planalto, junto à turma de depredadores. Alega que só entrou no prédio porque viu um conhecido. Ficou seis meses preso em Brasília e foi solto em agosto do ano passado. Filha de Ritter, a advogada Gabriela Ritter assegurou, na época da prisão, que o pai é íntegro, honesto, um homem que trabalhou na roça desde os oito anos e nunca teve vinculação político-partidária. Ritter foi condenado a 14 anos de prisão. Quando teve a prisão decretada, não foi mais encontrado. É procurado desde setembro de 2024, conforme o Banco Nacional de Mandados de Prisão do Judiciário.
Lucas Schwengber Wolf, 36 anos
É natural de Santiago e morador de Três Passos. Arquiteto e urbanista, chegou ao Distrito Federal em 8 de janeiro, em um ônibus que saiu de Santa Rosa. Ele admite que foi com um grupo à Praça dos Três Poderes "se manifestar contra o cerceamento do direito de expressão, inclusive virtualmente, que vem acontecendo". Ele se diz totalmente contra atos de vandalismo e assegura que não participou da depredação do Palácio do Planalto, onde foi detido em flagrante. Ficou preso numa penitenciária de Brasília até agosto do ano passado, quando foi solto, com determinação de usar tornozeleira eletrônica. Foi condenado a 14 anos de prisão e depois não foi mais encontrado. Seu nome consta desde maio de 2024 como procurado, no Banco Nacional de Mandados de Prisão do Judiciário.
Sônia Teresinha Possa, 66 anos
É natural de Erechim, radicada no Paraná. Viveu em Santa Terezinha do Itaipu e em Curitiba, onde atuou em hospitais e serviços administrativos. Foi detida no Palácio do Planalto e solta ainda em 8 de janeiro, em razão da idade. Em janeiro, foi condenada a 14 anos de prisão. Cumpre a pena num presídio.
Luiz Gustavo Lima Carvalho, 41 anos (ainda réu)
É o único dos oito réus por crimes graves que ainda não foi julgado. Vigilante e natural de Caxias do Sul, ele "foi flagrado circulando pelos corredores do Palácio do Planalto enquanto o prédio era depredado, trajando camiseta camuflada, chapéu marrom e utilizando uma bandeira do Brasil amarrada ao pescoço", nos dizeres do inquérito aberto pela Polícia Federal. Foi obrigado a usar tornozeleira eletrônica. O julgamento dele deve acontecer ainda no início deste ano.