O plástico tem sido objeto de atenção de autoridades, leis e debates sobre poluição nas últimas décadas. Segundo especialistas, o material não deve ser tratado como vilão da natureza: é importante para a sociedade moderna, capaz de ajudar na sustentabilidade. O desafio é ampliar a destinação correta para que ecossistemas e seres vivos não sejam prejudicados.
O assunto foi motivo de um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) em 2023, que destaca a possibilidade de reduzir a poluição plástica em 80% até 2040. Para isso, países, empresas e cidadãos precisam fazer “mudanças profundas” quanto ao tema.
Iniciativas políticas também têm focado na redução do material na sociedade. Desde 2018, Porto Alegre tem uma lei que proíbe os canudos plásticos descartáveis. Em Gramado, na Serra, uma legislação que proíbe a distribuição gratuita de sacolas plásticas entrou em vigor em março.
A redução do uso de plásticos foi motivada por adoção de estratégias sustentáveis na Able, uma empresa de contact center localizada no Tecnopuc, em Porto Alegre.
O trabalho começou em 2023, quando teve início uma proposta de conscientização e mobilização, com suporte da startup Green Thinking. O diálogo culminou, em 2024, no lançamento do programa Impacto 360, com práticas de ESG.
— O turbilhão da enchente mostrou que deve ser mudado nosso relacionamento com os resíduos, um dos fatores decisivos para a situação caótica que vivemos. Entendemos que a empresa está inserida nesse contexto e que adotar práticas sustentáveis, por mais simples que pareçam, podem ajudar a gerar grandes resultados — pontua Sthefany Barbosa, sócia-diretora da Able.
Entre as iniciativas está o abandono de plásticos descartáveis para o consumo de bebidas. Quem quiser café e água deve usar copos duráveis ou xícaras. O uso de sacolas ecológicas no lugar das plásticas é estimulado. Há cuidado na separação dos resíduos, com três lixeiras à disposição na cozinha.
Na entrada da empresa uma caixa de papelão é utilizada para o recolhimento de eletrônicos. Também foi criado um “código verde”, que fornece as diretrizes para integrar a sustentabilidade à rotina do trabalho.
— É um projeto que quer criar uma cultura. Não adianta chegar em casa e continuar a gerar resíduos. Queremos criar um discurso em termos de ajuste de comportamento para a sustentabilidade em todos os ambientes — acrescenta Sthefany.
Plástico não é o problema
Para Simara Souza, gerente do Instituto SustenPlást, a pecha de poluente não dialoga com a realidade do produto.
— Se eliminássemos o plástico, teríamos de aumentar a extração de madeira, a produção de vidro e haveria uma perda maior de alimentos. É uma demonização que não é científica. O plástico contribui para a sustentabilidade do planeta — pondera.
Simara está à frente do Tampinha Legal, programa socioambiental que fomenta a coleta de tampas de plástico em benefício de entidades assistenciais do terceiro setor. A iniciativa já recebeu 900 milhões de tampinhas que geraram R$ 4 milhões. Aliar o uso consciente à destinação adequada é uma saída indispensável para a economia circular.
— Colocar lixo no lixo é uma frase ruim, que só atrapalhou a humanidade. Não podemos olhar para os materiais como lixos, e sim tratá-los como matéria-prima. O papel, o alumínio, o plástico precisam voltar para a indústria. Todos esses materiais têm que ser destinados corretamente.
Evitar prejuízos à natureza
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a mudança para uma economia circular resultaria em uma economia de U$ 1,27 trilhão (cerca de R$ 7,3 trilhões), se considerados custos e receitas de reciclagem. Outros U$ 3,25 trilhões (R$ 18,68 trilhões) seriam economizados com saúde, clima, poluição do ar, degradação do ecossistema marinho e custos relacionados a litígios.
— Não viveríamos sem plástico, não o vejo como um vilão — resume Vanusca Dalosto Jahno, professora do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Feevale.
A especialista reforça a importância de ampliar a reciclagem do produto para que ele não polua o meio ambiente, situação que pode causar danos a ecossistemas e a seres humanos. Nesse contexto, os chamados microplásticos, peças do material com até cinco milímetros de diâmetro, são os vilões para o solo e corpos d’água.
— Ingerimos (plástico) se nos alimentamos de um peixe que estava em um rio com microplásticos. Qualquer plástico em local indevido pode cair no bueiro e entupir a drenagem em uma grande chuva. O acúmulo desses materiais se torna abrigo para insetos e animais que causam proliferação de doenças — exemplifica a especialista.
O que fazer em casa
Luiza Chamis, integrante da Green Thinking e coordenadora do Movimento Lixo Zero POA, diz adotar medidas para reduzir o uso de plásticos na rotina doméstica. A compra de produtos é um dos focos:
— Bolamos um kit que fica no carro ou em algum lugar da casa com sacolas retornáveis e de pano de vários tamanhos para o hortifrúti. No restante das mercadorias, é difícil fugir dos plásticos. Costumo pensar se preciso daquele produto e, se sim, se existe alguma possibilidade de transformar o plástico em outra coisa depois. Se eu sei que aquele material é 100% reciclável e sei destiná-lo, melhor ainda — conta.
A relação com o lixo orgânico também foi mudada: a moradora da Capital diz ter comprado uma composteira para orgânicos e assinado um pacote de coleta semanal para esse tipo de rejeito. Comprar alimentos a granel e reutilizar vidros também estão no escopo das medidas para reduzir o uso do material em casa.
— Pesquiso versões de produtos com menos plástico possível, evito compras na internet. Lavo os plásticos antes de descartar para a triagem, isso facilita o processo e abre uma margem maior para que aquele produto seja reciclado. Também não compro versões de frutas embaladas com o material — pontua Luiza.
Orientações da ONU para reduzir o plástico em casa e na sociedade
- Escolher produtos reutilizáveis em vez de descartáveis.
- Solicitar a supermercados, restaurantes e fornecedores o abandono de embalagens de plástico de uso único e apoiar inovações para evitar o uso de plástico descartável em produtos e embalagens.
- Escolher produtos de higiene pessoal sem plástico. Esse tipo de item é uma importante fonte de microplásticos, que chegam aos oceanos diretamente dos nossos banheiros.
- Durante viagens, levar a própria garrafa reutilizável e usar protetor solar próprio para recifes, sem microplásticos.
- Pedir às escolas, universidades ou locais de trabalho que proíbam o uso de plástico descartável e removam plásticos prejudiciais de suas cadeias de suprimentos.
- Solicitar às autoridades locais que melhorem a gestão de resíduos.
- Incentivar os tomadores de decisão a apoiar políticas para uma economia circular de plásticos.