Da última vez que eu vi o Bruno, ele me acalmava o choro de uma despedida que deveria ter prazo de validade dizendo: "calma, seis meses passam rápido". Ainda entre soluços, eu respondi "mas muita coisa acontece em seis meses". Numa das raras vezes em que eu preferia estar errada, infelizmente, muito aconteceu e não tornamos a nos ver. Sua vida de garoto de vinte e poucos anos, alegre, fã de Beatles, inteligente e gentil, teve fim pelas mãos de um taxista que furava o sinal vermelho da Avenida João Pessoa em alta velocidade num final de tarde ensolarado de sábado.
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Contudo, numa das não raras vezes que eu preferia estar certa, nada aconteceu em seis meses. E nada aconteceu também nos oito anos que se passaram desde então. Quero pedir desculpas aos pais e à irmã do Bruno por tocar novamente nessa dolorosa ferida - que pulsa em mim toda vez que eu vejo alguém de bicicleta na rua, ouço uma das músicas que a gente gostava ou passo na Rua da República, onde tantas vezes nos encontramos -, mas ao ler uma matéria como a publicada em ZH no dia 12 de maio (13 no jornal impresso), que mostra como um taxista que já matou três pessoas no trânsito segue trabalhando como taxista livremente, sinto a impunidade e a dor esfregadas na minha cara. Sinto meu coração despedaçado. Nada, absolutamente nada resultou da morte do meu querido amigo.
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É o que a gente pensa quando perde alguém dessa maneira brutal: "tomara que isso abra os olhos da sociedade e das autoridades para que ninguém mais morra desse jeito". Errado. Nada acontece. Gente como o Bruno e o Joel - artista e arquiteto da Capital, atropelado perto do aeroporto, cuja morte mobilizou a cidade- segue morrendo e gente como esse taxista ou o que matou o meu amigo segue impunemente carregando nossos familiares e amigos pela rua, destruindo nossos corações e nossas esperanças de que finalmente algo vai acontecer. Mas nada vai.
As brechas na legislação, que permitem que motoristas imprudentes matem no trânsito e sigam livres de punição mais severa fazem com que haja uma permissão para matar no Brasil. O carro tem o poder de matar alguém. Dirigi-lo com irresponsabilidade, desrespeitando limites e sob o efeito de drogas que colocam a vida de outras pessoas em risco, deveria ser punido com mais rigor. E quem mata no trânsito por consequência dessa imprudência deveria ser punido como quem sai na rua assumindo o risco de matar alguém.
Mas eu estava muito errada. Nada acontece em seis meses.
Opinião
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