Livros também são vítimas de preconceito. Pensei nisso assistindo ao Garota Verão na TV.
Vi aquelas meninas desfilando e pensei: até alguns anos atrás, boa parte delas responderia do mesmo jeito a uma das perguntas mais óbvias desse tipo de concurso. "O Pequeno Príncipe".
Ora, pândegas! Mulheres bonitas não podem ser inteligentes. Então, a obra de Saint-Exupéry acabou perdendo o seu encanto. A intelectualidade torceu o nariz. Hoje, falar sobre livro favorito é assunto borocoxô. Demodê.
Nada contra Paulo Coelho ou as sagas de vampiros e zumbis.
Só que O Pequeno Príncipe é um livro magistral. Tão magistral que foi copiado, inspirou filmes, romances, amizades, conversas, quadros, esculturas e músicas. Tão magistral que, de tanto ser citado, virou clichê. Hoje, pessoas que nunca leram uma sequer das suas páginas fazem piada com ele. Eu li várias vezes. E sempre me emociono.
Adoro o desenho que os adultos não entendem. Adoro a narrativa, a ternura, o texto.
Um outro exemplo: Fernão Capelo Gaivota, de Richard Bach. Um livro cheio de fotos e textos curtos que narram o drama de uma ave diferente. Ela desafiou o padrão de voo do bando, que torceu o bico. Fernão insistiu em ousar, em inovar.
Uma gaivota adolescente, que busca seu lugar no mundo. Eu era Fernão Capelo Gaivota aos 12 anos.
De repente, Fernão Capelo Gaivota sumiu, vítima do mesmo preconceito que transformou O Pequeno Príncipe naquilo que ele nunca foi. Para mim, ambos são gigantes em suas camadas de leitura, nas suas profundidades, contextos e mensagens.
Fernão Capelo Gaivota me fez voar. O Pequeno Príncipe me cativou. E a gente se torna... tá bom, sem exageros.
Defendo uma anistia ampla, geral e irrestrita a ambos. São meus ídolos de infância. E de muita gente que talvez tenha algum constrangimento de admitir. Porque é velho, porque é cafona, porque é analógico. Sei lá por que.
Concordo que um certo ar de modernidade digital cairia bem. Então, lá vai: #somostodosopequenoprincipe.
Melhorou? Já dá pra ler de novo?