Ele tem 30 anos, gasta parte do dia em grupos de mensagem no Facebook, sofre com a namorada que mora longe, em Brasília, e pensa na primeira pós-graduação em Administração. Quando chega às reuniões com outros dirigentes de futebol, nunca de terno ou gravata e quase sempre de camiseta e tênis (camisa polo, vez por outra, a título de concessão pragmática), não raro um de seus pares da antiga solta: “Lá vem o gurizão!”.
Começou com certo tom crítico, algo preconceituoso, dentro daquela velha ideia do neófito cheio de sonhos que, logo ali adiante, vai quebrar a cara ao topar com o muro intransponível do mundo real. Aos poucos, com os resultados dentro e fora do campo, virou elogio.
Vitor Magalhães, o jovem presidente do São Paulo-RG, encarna a renovação reivindicada em todo o país, único ponto de convergência entre os exércitos contra e a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff que desfilaram durante a semana em manifestações apaixonadas. É preciso renovar, e renovar por quem não tenha como meta se perpetuar no poder. Vitor veste esse figurino. Conheça um pouco do “gurizão” que fez o campeão gaúcho de 1933 renascer das cinzas. Confira meu papo com ele.
Qual o seu primeiro contato com o futebol?
Nasci em Bagé, terra natal de minha mãe. Fui morar em Rio Grande apenas aos 17 anos. Eu frequentava o Aldo Dapuzzo durante as férias com o meu pai, um rio-grandino e rubro-verde fanático. Assim fui tomando contato com o clube. Há três anos, nem imaginava ser presidente. Comecei como voluntário, depois aceitei ser diretor administrativo, a pedido de um amigo. Depois me tornei vice-presidente social. Assumi em fins de 2015, depois que o Cláudio Louzada, sucessor de Domingos Escobar, desistiu da posse ao descobrir que os cofres estavam totalmente raspados.
Imaginava ser presidente?
Nunca pensei. Há preconceito por estar em um cargo habitualmente ocupado por pessoas mais velhas? No começo, eu me assustava quando me chamavam de gurizão. Eu sempre era o mais jovem em qualquer conversa ou reunião. Agora não me assusto mais. Os resultados, dentro e fora do campo, ajudaram muito nesse sentido. A imagem do guri foi perdendo força, pelo lado pejorativo, por isso.
Quais resultados, além de estar no G-4?
Os balanços são mostrados com regularidade ao Conselho Fiscal. Quando assumi, eram 273 sócios, com receita de R$ 10 mil. Agora são 1.189 e R$ 50 mil. Não tínhamos nada de patrocínio. Negociamos R$ 400 mil com oito patrocinadores pelo Gauchão em nossa camiseta. Só a Yara, empresa norueguesa de fertilizantes, comprou uma cota de R$ 100 mil. Nossa folha é de R$ 109 mil. É pouco até para a Divisão de Acesso, mas não gasto mais do que arrecado.
Os salários estão em dia?
Nesse ponto, a torcida tem sido formidável. Para bancar todos os custos, que incluem reformas no estádio e outras questões, tomamos empréstimo com empresários para não atrasar a folha dos jogadores, pagando com a renda dos jogos seguintes. Tem dado certo, o que aumentou a credibilidade para tomar os empréstimos. Nunca atrasamos. E não devemos. E os resultados de campo? Planejamos o Gauchão desde maio, para não sofrer como nos anos anteriores. Fizemos uma pré-temporada de quase dois meses. O Hélio Vieira começou a trabalhar e a indicar contratações ainda em outubro.
Você vai concorrer à reeleição?
O mandato é de um ano. Termina em dezembro. Não quero pensar nisso agora. Mas tenho de tocar minha vida. Quero estudar, fazer pós-graduação. Se minha namorada morasse comigo, e não em Brasília, duvido que ela permitisse (risos). Se continuar no cargo, talvez não possa tocar estes projetos. O São Paulo toma grande parte do meu dia. Tenho emprego, trabalho como gerente de tecnologia numa multinacional. Preciso me sustentar. Não tenho pretensão de me perpetuar no clube, essas coisas. Quero só ajudar essa torcida incrível que nós temos.
Qual a sua opinião sobre o fim dos campeonatos estaduais?
Fico triste quando ouço defensores desta tese. Os estaduais não são o vilão de todos os males. Com um R$ 1 milhão de cota da FGF, dá para fazer time e melhorar o estádio, qualificando o campeonato. Este ano, por exemplo, não tivemos este dinheiro, adiantado pela gestão anterior. E estamos indo bem. O que não pode é pegar o dinheiro e pagar salários altos, para depois não pagá-los. Tem de ter gestão.
E a Série D?
O projeto do São Paulo é nacional. Estamos quase com a vaga assegurada, mas só participaremos se tivermos dinheiro para custeá-la.
Há planejamento de crescimento de sócios para bancar a Série D?
O número ideal é 5 mil, mas sou pessimista para esta meta. Imagino que com 3 mil sócios mais patrocínio e cota da FGF, que não ganhamos este ano, é posssível disputar. Do contrário, nada feito. Não gastarei mais do que arrecadar.
O São Paulo não pegou a cota da FGF para o Gauchão deste ano? Não. Antes de eu assumir, o presidente Francisco Novelletto me disse: “Sabes bem onde estás se metendo? Não terás cota, infelizmente. Foi tudo adiantado”. Eu disse a ele: “Sei sim. Pode ter certeza: o senhor e as pessoas vão se orgulhar do São Paulo”.
*ZHESPORTES