A inflação oficial do país, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), fechou 2024 em 4,83%, acima do teto da meta, de 4,5%. Os dados foram divulgados nesta sexta-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
É a oitava vez que a autoridade monetária falha em cumprir a meta desde o início do regime, em 1999. A meta de inflação do ano passado era de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima e para baixo.
O IPCA de dezembro foi de 0,52%, acima da taxa de novembro (0,39%).
Grupos
Para apurar o índice, o IBGE colhe dados de 377 produtos e serviços, os chamados subitens, que são distribuídos em nove grupos.
A maior pressão de alta de preços em 2024 veio do grupo Alimentação e bebidas, que subiu 7,69%. Essa alta é a maior desde 2022, quando ficou em 11,64%.
Esse encarecimento contrasta com o comportamento dos preços no começo do ano, que caíram. Mas o repique de setembro a dezembro, com alta de 23,88%, foi suficiente para o ano fechar com alta.
— Essa queda do primeiro semestre foi mais que compensada pelas altas — define o analista do IBGE André Almeida.
Ele explica que há efeito direto de questões climáticas no comportamento do preço do alimento que vai ao prato do brasileiro.
— A gente teve uma forte estiagem, ondas de calor, seca em diversas regiões do país, o que intensificou os efeitos da entressafra, quando as pastagens ficaram ainda mais restritas. A gente teve, por conta do próprio ciclo da pecuária, um menor volume de animais para abates, o que reduz a oferta do produto para o consumidor final e acaba pressionando os preços — completa a explicação.
O IBGE identificou que as principais altas dentro do item carnes foram o contrafilé (20,06%), carne de porco (20,06%), alcatra (21,13%) e costela (21,33%). Esses subitens só perdem para o café moído (39,60%) e o óleo de soja (29,21%). Mesmo assim, as carnes influenciam mais o IPCA, pois têm maior peso na cesta de produtos do brasileiro.
Descumprimento já era aguardado
O descumprimento da meta de inflação de 2024 era esperado pelo mercado financeiro e pelo próprio Banco Central.
A autoridade monetária previa um IPCA de 4,9% e considerava haver 100% de chance de estouro do teto no ano passado, conforme o último Relatório Trimestral de Inflação (RTI).
Esta é a última vez que o cumprimento do alvo de inflação foi feito de acordo com o regime original de metas, adotado no Brasil em 1999. Esse sistema considerava o IPCA acumulado no ano-calendário.
A partir deste ano, passa a valer um novo sistema de meta contínua, com centro de 3%, apurada com base na inflação acumulada em 12 meses. Se ela ficar acima ou abaixo do intervalo de tolerância (1,5% a 4,5%) por seis meses consecutivos, considera-se que o alvo foi perdido.
Credibilidade
Economistas consideram que o descumprimento do alvo em 2024 tem poucos impactos para a credibilidade do Banco Central ou do regime de metas.
O IPCA do ano passado sofreu efeitos de eventos climáticos extremos, valorização de mais de 27% do dólar ante o real e robustez da atividade econômica.
— O BC reagiu a esse desafio, interrompeu um processo de corte de juros e passou a elevar a Selic. Não havia muito o que fazer. A inflação ficou acima da meta em parte por causa desses choques, e o BC tem de atuar para evitar efeitos secundários, o que ele está fazendo agora — diz o estrategista-chefe e sócio da EPS Investimentos, Luciano Rostagno.
A autoridade monetária começou o ano passado no meio de um ciclo de corte de juros e chegou a reduzir a Selic a 10,50% em maio. Depois, voltou a elevar a taxa básica, que chegou a 12,25% em dezembro. Diante do aumento das expectativas de inflação, o BC indicou dois aumentos de um ponto porcentual este ano, que levariam os juros a 14,25% até março.
A economista-chefe para o Brasil da Galapagos Capital, Tatiana Pinheiro, considera que o comportamento das expectativas de inflação será o principal termômetro da credibilidade este ano.
Ela lembra que, a partir de agora, o BC terá de publicar trimestralmente, no novo Relatório de Política Monetária, uma avaliação sobre o processo de convergência. Se as projeções de inflação da autarquia para o seu horizonte relevante continuarem subindo, isso pode trazer impactos para a credibilidade, destaca a economista.
— Se vier o relatório do primeiro trimestre e ficar mais distante da meta do que em dezembro, e chegar o segundo trimestre e você tiver uma revisão constante da inflação para cima, é com base na revisão da expectativa, seja do mercado, seja do modelo do BC, nesse intervalo relevante, que podemos falar de um ganho ou perda de credibilidade — diz Pinheiro.