Com fatores que vão desde a abertura de novos mercados e aumento de preços até a retomada sobre uma demanda reprimida, os ramos de alimentação e automotivo tiveram destaque no avanço das exportações da indústria do Rio Grande do Sul no ano passado. Esses dois segmentos estão entre os grupos com participação importante no crescimento de quase 22% nas exportações da indústria de transformação no ano passado. Os dados são da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs).
Em 2022, o setor de alimentos registrou US$ 5,8 bilhões em exportações — incremento de US$ 1,3 bilhão e avanço de 29,1% ante 2021. Já o de veículos automotores, reboques e carrocerias aumentou os valores de exportação em US$ 439 milhões, alta de 65,3% na comparação com o ano anterior. Além de impactar a produção, esse movimento também reflete no emprego em algumas áreas, segundo especialistas. Para este ano, o cenário das vendas para o Exterior depende das políticas do novo governo e do apetite das economias ao redor do mundo.
A participação dos alimentos dentro das exportações não é algo inédito, mas o segmento apresentou salto expressivo no ano passado. O óleo de soja bruto é um dos destaques dentro das vendas externas do grupo. Esse produto anotou US$ 776 milhões em vendas para outros países em 2022, acréscimo de US$ 354 milhões, com destaque para o mercado indiano. O farelo de soja, com mais US$ 310 milhões em exportações ante 2021, também ocupou parcela significativa dentro da alta da indústria da alimentação.
O superintendente de estudos de mercado e gestão da oferta da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Allan Silveira, afirma que esse movimento é explicado por mudanças provocadas na oferta de óleos vegetais no mundo no ano passado:
— 2022 foi um ano com pouca disponibilidade de óleo e farelo de soja da Argentina. Então, com a menor disponibilidade de óleo de girassol na Europa, menor quantidade de óleo e farelo de soja por parte da Argentina, que é o maior exportador, houve abertura de mercados para o Brasil.
A professora Camila Flores Orth, do curso de Ciências Econômicas da Unisinos, reforça o peso da guerra na Ucrânia no impulso da exportação do óleo de soja do Estado. Com a Ucrânia não conseguindo escoar a produção diante do conflito, o Brasil acabou levando vantagem em um cenário com demanda aquecida:
— Perdeu-se esse grande produtor e exportador de óleo vegetal e com isso o preço mundial, dentro da dinâmica de oferta e demanda, acabou aumentando. A gente se beneficiou de alguma forma, porque, mesmo não exportando tanto o óleo de girassol, o óleo de soja acaba sendo um bom substituto.
Já o grupo de fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias registrou US$ 1,1 bilhão nas vendas externas em 2022. Esse avanço de 65,3% ante o resultado de 2021 ocorre na esteira de bons resultados nos produtos automóveis, chassis e carrocerias para veículos automóveis e autopeças, segundo a Fiergs.
O vice-presidente de Indústria da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul, Ruben Antonio Bisi, afirma que esse salto está muito ligado à retomada do segmento após o choque causado pela pandemia na produção e expansão para novos mercados. Nesse sentido, ele destaca alguns movimentos observados na Serra, um dos principais polos da indústria metalmecânica gaúcha:
— Tem a nossa inserção em novos mercados, como a Randon, que está começando a entrar nos Estados Unidos, e a Marcopolo e o setor automotivo de carrocerias que está entrando fortemente na África. Teve bons pedidos do Chile, da Colômbia e, inclusive, da Argentina.
Bisi destaca que esse aumento nas vendas externas e recuperação de mercados ajuda nos investimentos e nas contratações no setor. Os dados do novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) corroboram a análise do dirigente. No acumulado de janeiro a novembro de 2022, o segmento de fabricação de veículos automotores, reboques e carrocerias abriu 4,5 mil vagas no Estado – quase o dobro do montante observado em 2021 (2,2 mil).
— Todas as empresas aqui ligadas ao setor automotivo contrataram bastante até novembro — pontua.
Com tradição e polo na região do Vale do Rio Pardo, o setor Tabaco também apresentou números expressivos dentro do avanço das exportações da indústria. O ramo teve incremento nominal de US$ 947 milhões em 2022, atingindo salto de 78,3% em relação a 2021.
Próximos meses
No levantamento de 2022, a Fiergs explica que o avanço das exportações no Rio Grande do Sul se dá, principalmente, pela elevação dos preços dos produtos exportados, que apresentaram variação acima da quantidade exportada.
Para este ano, especialistas afirmam que o cenário para as exportações no país e no Estado não está claro, porque conta com uma série de condicionantes. Desaceleração das economias de países desenvolvidos, impactos da inflação, da guerra na Ucrânia e alterações no preço dos combustíveis podem prejudicar as vendas para o mercado externo. Por outro lado, eventual retomada de fôlego por parte da China, um dos principais destinos dos produtos brasileiros, pode ajudar a amenizar esses problemas, segundo a professora Camila Flores Orth.
— A China, com essas medidas de retirada do covid zero, a expectativa é de voltar a ter um crescimento mais acelerado em 2023. Com isso, a gente pode ver um aumento de exportação para a China.
No âmbito do óleo e do farelo de soja, o superintendente de estudos de mercado e gestão da oferta da Conab afirma que o ambiente para as vendas brasileiras deve seguir positivo diante da desregulação do mercado internacional de óleos vegetais.
O vice-presidente de Indústria CIC afirma que o desempenho do setor automotivo, principalmente na linha dos veículos pesados, deve seguir aquecido, mas em ritmo de acomodação. Parte dos empresários do setor adota cautela nos investimentos na espera das primeiras ações do novo governo, segundo Bisi. Alguns problemas na produção, como a falta de semicondutores, também seguem pesando, mesmo que em um patamar menor na comparação com anos anteriores:
— Vai ter uma pequena redução, um pequeno ajuste em alguns segmentos, mas depois teremos retomada no segundo semestre. Não é uma perspectiva pessimista. É otimista com um pouco de cautela.