A pandemia do coronavírus colocou em xeque o maior negócio da área aeroespacial da história do Brasil, a compra da divisão de aviação comercial da Embraer pela Boeing.
A fabricante norte-americana está reavaliando o acordo, no qual gastaria US$ 4,2 bilhões (cerca de R$ 21 bilhões na cotação desta sexta-feira, 20) por conta do pedido de salvamento de US$ 60 bilhões (R$ 300 bilhões) que fez ao governo Donald Trump.
Segundo pessoas envolvidas com a negociação, a vontade americana é manter a compra e não há decisão final tomada, e o lado brasileiro não foi informado de qualquer mudança de planos.
A Boeing já vinha enfrentando a maior crise de sua história com a paralisação da linha de produção de seu principal avião, o 737 MAX, devido a problemas técnicos que causaram dois acidentes, em 2019 e 2020, deixando 346 mortos.
Apesar de vários anúncios de retomada da venda, a empresa progressivamente foi frustrada por autoridades aeronáuticas e, no começo deste ano, parou a fabricação. Espera retomar o produto este ano, mas analistas têm dúvidas sobre isso. A crise do coronavírus agravou a situação. De janeiro para cá, o mercado aeroespacial teve uma forte queda devido à expectativa de redução de demanda.
A Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata) estima que 2020 terá uma queda de até 30% na média no número de passageiros, que em 2019 foi de cerca de 4,5 bilhões.
No Brasil, as maiores empresas do setor, Latam e Gol, já anunciaram cortes de 60% a 70% de seus voos neste primeiro momento de restrição devido à pandemia. Reduções de jornada já começaram.
As ações da Boeing despencaram 62% desde janeiro, movimento semelhante aos da sua rival europeia Airbus (54%) e da Embraer (50%). Nenhuma empresa divulgou números, mas há relatos de estocagem de modelos bons de venda, como o Airbus-321 ou o Boeing-787. A Embraer confirmou que iria adiar algumas entregas, sem oferecer detalhes.
Em nota, a Boeing disse que não comentaria "discussões entre as partes ou especulações do mercado", e continuou dizendo que "estamos trabalhando no processo de aprovações regulatórias e em condições ainda pendentes para a conclusão do negócio".
O acordo Boeing-Embraer é um enredo que se desenrola desde o fim de 2017. No começo de 2019, o modelo que agradou a todos foi acertado: a área comercial brasileira terá 80% de controle americano (os US$ 4,2 bilhões), enquanto a divisão de defesa e jatos comerciais seguirá com Embraer nacional. Os acionistas da Embraer ganhariam com o negócio US$ 1,6 bilhão (R$ 8 bilhões) em dividendos.
A nova fabricante passou a ser chamada de Boeing Brasil - Commercial e, durante todo o ano passado, foi feito um intrincado trabalho para separar as empresas, que está praticamente finalizado.