
Foi uma quarta-feira (16) agitada nos mercados financeiros. A restrição de exportação de chips americanos determinada por Donald Trump afetou as bolsas, especialmente as americanas. O dólar no Brasil, que havia chegado a R$ 5,916 pela manhã, retomou as quedas discretas interrompidas na véspera. Fechou com oscilação para baixo de 0,44%, a R$ 5,865.
A nova barreira comercial de Donald Trump afeta especificamente a Nvidia, que projeta perdas de US$ 5,5 bilhões. Com isso, as ações da empresa despencaram 7,5%. A Nasdaq, bolsa de tecnologia onde se negociam essas ações, caiu 3,1%. Os índices da bolsa de Nova York tiveram perdas entre 1,7% no DJIA, o mais tradicional, e 2,3% no S&P 500, o mais abrangente. No Brasil, o Ibovespa recua cerca de 0,8%.
A tensão da manhã causada por citação de uma tarifa de 245% para a China amainou com a correção, mas voltou com declarações de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA). Ele disse ver um "cenário desafiador" com "mudança na política comercial". A situação mais provável, avaliou, é de queda no emprego por desaceleração no crescimento e aumento na inflação.
— Acho que vamos nos afastar das metas neste ano, ou ao menos não faremos progresso — disse Powell, reforçando o alerta de que o juro nos EUA não vai baixar tão cedo.
Powell ainda afirmou que os mercados estão "em situação difícil", mas que seguem "funcionais", mas advertiu que "se os EUA se tornarem uma jurisdição na qual os riscos serão estruturalmente altos à frente, isso nos tornaria menos atrativos".
A Nvidia é uma empresa que vinha decolando na esteira da inteligência artificial. Integra um grupo chamado, nos EUA, de "magnificent seven" – referência a um filme clássico de faroeste que teve remake em 2016. Compõem essa elite Alphabet (Google), Amazon, Apple, Meta (Facebook, Instagram, WhatsApp), Microsoft, Nvidia e Tesla.
Os erros em cascata no tarifaço
1. De diagnóstico: para Trump, os déficits comerciais dos EUA estão na raiz de todos os problemas. A coluna já detalhou que, em muitos casos, esses resultados são provocados por... companhias americanas. A Apple tem produção espalhada por todo o globo e assina seus dispositivos com "Designed by Apple in California", assim como montadoras de carros e até de tênis, como a Nike e suas 71 unidades só no Vietnã.
2. De objetivo: em teoria, a meta é forçar empresas americanas – como Apple e Nike – a levar essa produção descentralizada de volta aos EUA para fugir das tarifas punitivas. Esse processo leva anos: é preciso construir unidades, comprar equipamentos. Se der certo, vai dar muito errado: a corrida de volta para casa tende a provocar uma demanda difícil de atender, o que pressionaria a inflação já elevada pela entrada de produtos com maior tarifa de importação. Outra expectativa é arrecadar mais para financiar cortes de impostos que Trump planeja fazer sem impactar ainda mais a já pesada dívida dos EUA. Mas não são governos que pagam tarifas. Nem os odiados estrangeiros. Como as tarifas são repassadas aos preços, quem vai bancar o tarifaço será o americano que comprar produtos importados.
3. De concepção: o tarifaço era aguardado. Gigantes financeiras, como Goldman Sachs e universidades de primeira linha, como Yale, projetaram, na pior das hipóteses, tarifas lineares de 25%. Engano de quem projetou? Não, de quem concebeu a possibilidade de sobretaxas de até 145%. Tarifas mais baixas provocariam efeitos negativos, mas não derretimento de mercados e perda de confiança nos Treasuries.
4. De elaboração: como era preciso fazer muitos cálculos, United States Trade Representative (USTR, principal órgão de comércio exterior dos EUA) simplificou: dividiu o superávit comercial de cada país com os EUA pelo total das exportações dessa mesma nação. E dividiu outra vez por dois, para ser "gentil". A inclusão de uma ilha povoada apenas por pinguins e focas nos 10% da "tarifa padrão" reforça o grau de amadorismo.
5. De aplicação: o anúncio foi feito em 2 de abril. As tarifas padrão, de 10%, passaram a incidir já no dia 5 e as punitivas chegaram a entrar em vigor nesta quarta-feira (9) antes de serem suspensas. Se era para negociar, o prazo deveria ter sido maior.
6. De avaliação: na Trumposfera, a China acataria sem chiar uma alíquota que a essa altura soma inacreditáveis 145%. Mas o gigante asiático retaliou – com "gentileza", para até 125% – e o presidente americano acusou o golpe, dizendo que o país oriental havia "entrado em pânico" e "não sabia jogar". A OMC estima que essa soma inviabiliza 80% do comércio entre os dois países.