
Quase dois meses atrás, escrevi uma coluna em que declarei voto em qualquer candidato que nos devolva a paz e a confiança na democracia. Até aqui, as pesquisas indicam que esse candidato é Lula. Não estou fazendo campanha para ele, estou em campanha pelo país. Mesmo assim, recebi agressões verbais, como “mau-caráter” e “esquerdopata”. Nem sei o que é esquerdopata. Sou ignorante, mas disso, curiosamente, ninguém me chamou.
Fui criada em meio a livros, teatro e música, mas vivi a infância numa bolha social. Mesmo desenvolvendo ideias libertárias, só quando entrei na faculdade é que fui introduzida a um Brasil que eu desconhecia. No terceiro semestre do curso, comecei a trabalhar e a conviver com pessoas com uma trajetória mais difícil que a minha — não sou filha de banqueiros, longe disso, mas reconheci claramente meus privilégios.
Aos 34, larguei a profissão para focar na escrita, e a convivência com o meio intelectual me expandiu, me tornou mais consciente. Mergulhei mais ainda nos livros e, aos 56, comecei a namorar um profundo conhecedor de História e política. Não concordamos 100%, mas tenho aprendido bastante com ele. E faz dois anos que participo de um grupo de WhatsApp com cerca de 200 escritores, jornalistas e representantes da cultura luso-brasileira: tenho acesso a textos, opiniões e experiências de pensadores fundamentais, afinados com os valores essenciais da existência. A cada dia aprendo mais. A cada dia mesmo.
Esse retrospecto é para lembrar que somos ignorantes até termos a oportunidade de ganhar mais conhecimento e de nos informarmos por fontes diversas, não apenas pela nossa turma. Ainda sou ignorante, mas bem menos do que já fui, e não pretendo parar de aprender. É por isso que, entre as ofensas que dominam as redes sociais nesse período pré-eleitoral, “mau-caráter” deveria ser reservado apenas aos que têm o caráter ruim mesmo: não sabem e têm raiva de quem sabe.
Ignorante não é ofensa. É um alerta. Sei que é impossível acompanhar todos os sites independentes, todas as postagens esclarecedoras do Eduardo Moreira, da Elisa Lucinda, da Eliane Brum e tantos outros faróis, mas temos a obrigação de procurar abrir nossa cabeça, a fim de parar de confundir humanismo com comunismo, direitos humanos com impunidade, liberdade de expressão com mentira. Nenhum problema em divergirmos, desde que conheçamos melhor a quem estamos defendendo ou acusando.
Temos ainda alguns meses antes de 1º de outubro para escutar e estudar bastante sobre escravidão, feminismo, economia, meio-ambiente e povos indígenas. É esse aprendizado constante que vai garantir um futuro menos alienado e raivoso para a geração que nos suceder. O Brasil não termina em nós.