Visitar o Gigantinho, em Porto Alegre, é quase uma viagem ao passado: o ginásio pouco mudou desde a sua inauguração, em 1973. E o peso dos seus quase 50 anos fica mais evidente porque ele divide o mesmo pátio com o seu irmão mais velho, o estádio Beira-Rio, que é de 1969, mas pulou para este século graças às reformas que ganhou para a Copa do Mundo de 2014.
Assim, o Gigantinho, que já foi palco de grandes shows musicais e importantes eventos esportivos, nos últimos anos se viu em degradação, com o espaço alagando em dias de chuva devido a infiltrações no teto, pichação em suas paredes, vidros quebrados e reclamações dos frequentadores — que apontavam desde as más condições dos banheiros até a acústica ruim, mostrando que o local não acompanhou as exigências do público.
Este cenário levou o Sport Club Internacional a abrir um edital para escolher uma empresa que pudesse assumir o espaço, modernizá-lo e, assim, resgatar a glória de outros tempos, tornando o centro multiuso novamente produtivo. O projeto foi criado, a escolha foi feita em 2020 — quem cumpriu os requisitos para assumir o local foi o consórcio formado por Opus e DC Set —, mas negociações ainda estão sendo realizadas, e a passagem de bastão não tem data para acontecer.
Com o clube passando por dificuldades financeiras e a situação do contrato ainda em espera por uma conclusão, o Gigantinho se viu em um limbo. Porém, nos últimos meses, eventos de grande porte começaram a ser anunciados no espaço — o primeiro foi o Disney On Ice, em maio, e no próximo domingo (21) tem Milton Nascimento. Sandy, Ney Matogrosso, Martinho da Vila, Kleiton & Kledir e Luccas Neto também devem se apresentar no local ainda em 2022.
Este movimento de levar novamente grandes artistas para o Gigantinho acontece porque o espaço está novamente operacional, em um movimento do Internacional para reativar a agenda de shows do local e, assim, conseguir incrementar a sua receita. Além das benfeitorias do local, o clube trabalha em conjunto com a BRIO, mantenedora que gerencia as áreas nobres do Complexo Beira-Rio, que entra na gestão das locações do ginásio.
Para que tudo isso fosse possível, a iniciativa começou com um estudo nos valores cobrados por outras casas de shows na Capital e no Brasil e, a partir disso, houve uma atualização na cobrança de locação do espaço, inclusive com um incremento de 400% em um contrato de recorrência do ginásio, segundo o vice-presidente de Administração e Patrimônio do Inter, Victor Grunberg — a diária do local passou a custar R$ 45 mil, com descontos para os dias de montagem e desmontagem e possibilidade de negociação para agendas com mais de uma apresentação.
Cobrando um valor alinhado com o mercado, principalmente com o argumento da localização privilegiada e da grande capacidade do ginásio, o próximo passo foi fechar contratos para conseguir verba para fazer os ajustes que o local precisava — e graças a um pacote de locações por parte da Opus para este ano, com pagamento à vista, foi possível fazer investimentos para deixar o ginásio novamente operacional e, assim, voltar a abrigar os espetáculos que eram comuns anos atrás.
— A nossa ideia foi gastar o menos possível, mas deixar o Gigantinho novamente operacional e saudável. O pacote de melhorias foi focado bem na área do público. Os investimentos foram para que o espaço voltasse a receber eventos, mas já prevendo que, mais cedo ou mais tarde, ele vai ser assumido para a iniciativa privada, por conta do edital — aponta Grunberg.
Já o presidente da Opus, Carlos Konrath, explica que o motivo para sua empresa fazer a aposta no Gigantinho para este ano foi valorizar o espaço, que considera um patrimônio do Estado, que carrega em sua história grandes momentos para a cultura. Segundo ele, as melhorias que viu no ginásio até agora são "muito boas" e contribuem para toda a comunidade do entretenimento.
— Da maneira como o Gigantinho se apresentava, as melhorias feitas são o que temos para o momento. O Brasil é um país muito carente de grandes casas, e a opção é abrir mão do Rio Grande do Sul ou buscar condições para que a gente possa manter o Estado no roteiro de bons e grandes espetáculos. O espaço que se tem é o Gigantinho e, neste momento, estes ajustes são o que deu para fazer — destaca Konrath.
Visita
Na última terça-feira (16), a reportagem visitou o Gigantinho, tendo Grunberg e Matheus da Costa e Silva, gerente de Patrimônio, como guias. A dupla apontou todas as melhorias realizadas no espaço em 2022 e, também, o que ainda precisa ser trabalhado.
Logo na entrada do ginásio, é possível sentir o cheiro de tinta — evidenciando que o espaço passou por uma pintura recente. As arquibancadas de concreto e as cadeiras de metal — a maioria, ainda da década de 1970 — com cores vibrantes comprovam que houve uma revitalização das mesmas. Os gradis também estão com nova pintura, branca.
Dentro do ginásio, atualmente, é possível abrigar 10.150 pessoas, uma redução considerável de sua capacidade máxima, que já chegou a 17 mil. Esta atualização se deve às normas do Plano de Prevenção Contra Incêndio (PPCI), que foi aprovado em dezembro de 2021 e tem validade de dois anos. Além das melhorias para obter esta aprovação junto aos Bombeiros para operar, o local ainda teve outras reformas pontuais para receber os shows — o investimento total foi de R$ 350 mil.
O telhado, que antes chegava a ter 40 pontos de infiltração, o que causava alagamento em dias de chuva, atualmente conta com quatro. As goteiras chegam a formar pequenas poças na quadra, que está com a madeira danificada. Os ajustes finais na cobertura do espaço devem ser resolvidos em até 40 dias, acredita Costa e Silva. Para o show de Milton Nascimento, caso os problemas ainda não estejam sanados, não há previsão de chuva, então, as infiltrações não devem atrapalhar. O piso da quadra, com partes estragadas, será sobreposto com placas trazidas pela equipe do artista.
Alvos de reclamação por parte do público frequentador, os banheiros do Gigantinho estão funcionais. O aspecto não é bonito, com o piso e os espelhos desgastados, mas as pias, apesar das torneiras não seguirem um padrão, estão cumprindo os seus objetivos. Há papel higiênico nas cabines, com assentos em todos os vasos sanitários — tanto nos femininos quanto nos masculinos —, com descargas funcionando, incluindo nos mictórios. Além disso, há sabão e papel-toalha nos reservatórios. Uma limpeza ainda é feita antes de cada show.
As principais janelas do Gigantinho, que ficam acima das arquibancadas, tiveram os vidros quebrados trocados, o que impede que chuva e vento entrem para a plateia. Ainda há vidros danificados no entorno do ginásio, mas em locais que não influenciam diretamente na experiência do público, como nos portões. Segundo o gerente de Patrimônio, estes serão trocados em breve, uma vez que a contratação para tal serviço já foi realizada. Na questão de acessibilidade, o centro multiuso fica devendo. O local destinado para cadeirantes é apenas a quadra, que conta com rampas móveis. Não é possível ter uma visão de cima, com acesso aos espaços onde ficam as cadeiras ou as arquibancadas.
As pichações nas paredes externas do Gigantinho, por enquanto, não têm data para serem limpadas, uma vez que a revitalização externa está acontecendo de cima para baixo — começando com a pintura da cobertura do ginásio, assim que todas as infiltrações forem resolvidas, com as chapas trocadas. A iluminação ainda está com alguns refletores queimados, mas Costa e Silva e Grunberg garantem que os que estão funcionando, após manutenção, dão conta das apresentações com bastante competência.
A parte elétrica do ginásio teve melhorias pontuais, para abrigar as apresentações atuais, sem riscos. Porém, espera-se que, quando o Gigantinho passar a ser comandando pelo novo gestor, toda a fiação seja trocada. Já na questão da acústica, que sempre foi alvo de críticas, uma vez que o espaço não foi construído originalmente com a intenção de abrigar shows, mas sim eventos esportivos, Grunberg e Costa e Silva destacam que segue da mesma forma e que não deve ser mexida antes da nova gestão.
— Fizemos o melhor, com um investimento reduzido, priorizando apenas as partes que serão utilizadas para os shows — aponta Costa e Silva.
E, de fato, os locais que não serão frequentados em dias de show seguem com aspecto de abandono, como as cabines de imprensa, os camarotes — estes, inclusive, com o forro caindo —, as tribunas de honra, as salas administrativas e o espaço ocupado pelas torcidas organizadas. As reformas, realmente, foram focadas apenas nos shows. Os artistas que se apresentarão no local, inclusive, trarão contêineres próprios para utilizarem como camarim, visto que não há um espaço reformado dentro do Gigantinho para servir a este propósito.
O Gigantinho, atualmente, abriga a Fundação de Educação e Cultura do Sport Club Internacional (FECI), que promove ações de estímulo à cultura, à educação e ao esporte para crianças e adolescentes. E, nas noites de frio intenso, abre as suas portas para abrigar moradores de rua. E, mesmo com diversos problemas ainda a serem resolvidos, o tradicional ginásio está recuperando o seu espaço. Além das 12 datas já acordadas com a Opus para 2022, outras produtoras estão procurando o Gigantinho para levarem os seus shows — a expectativa é que o ano abrigue cerca de 20 grandes espetáculos, com segurança e conforto para o público, dentro das limitações do espaço.
— Não tem risco estrutural nenhum. É uma construção antiga, mas muito reforçada — garante Grunberg.
— É uma fortaleza — finaliza Costa e Silva.