Nova York - No Bronx é possível ouvir a velha piada da Zâmbia sobre o devedor relutante que faz o possível para se esconder do agiota do bairro atrás da cortina que separa os tradicionais apartamentos de um quarto só, com os dedos do pé aparecendo.
- Ele vai passar o dia fora - diz a esposa do devedor.
- Bom, na próxima vez que ele sair - diz o agiota - ele deveria levar os pés.
No Queens talvez você ouça uma sobre um chinesinho que solta a pilha de fogos de artifício cerimoniais da família em casa, fazendo com que seus vizinhos perplexos corram para lá para ver qual evento da vida os fogos tradicionais homenageiam. "Não há nenhuma cerimônia agora", diz o garoto. "Mas quando meu pai chegar em casa, será meu funeral."
Você também pode ouvir um toque étnico em outro clássico, como o que o comediante norte-americano e palestino Dean Obeidallah, que se apresentou no final de semana em um programa de humor árabe e do sul da Ásia, ofereceu em uma entrevista: "Levem minha terra, por favor!".
Em uma cidade onde um padre, um imame e um rabino poderiam mesmo entrar em um bar a qualquer hora - junto com quase qualquer pessoa do mundo - o que faz as diferentes culturas rirem é tão diversificado quanto a própria cidade. Mas, diferentemente das comidas de vários países que são devoradas por nova-iorquinos de todos os tipos, o cenário cômico imigrante é mais limitado em sua abordagem e frequentemente mais difícil de ser digerido por um público mais amplo.
Para alguns comediantes estrangeiros nos Estados Unidos, aperfeiçoar a comédia stand-up - uma forma de arte tão americana quanto, digamos, o jazz - pode ser uma conquista para a assimilação. Para os outros, o segredo é abraçar um nicho ao invés de tentar construir uma corrente de seguidores.
Nos clubes de comédia de Nova York, as piadas são, em grande parte, em inglês, com exceção de uma noite especial dedicada, digamos, a comediantes latinos ou a alguma estrela cômica polonesa. Como resultado, muitos comediantes estrangeiros excepcionalmente arranjam shows em igrejas, restaurantes e até mesmo salões de eventos, frequentemente pagando as próprias despesas.
Em um teatro na Baruch College, em Manhattan, em fevereiro, ficou claro que a aposta de Joe Wong, comediante norte-americano e chinês de Boston, fez ao gastar 3,7 mil dólares para fazer um show em mandarim, deu certo. Wong atribui a popularidade de seu show em mandarim ao fato de que o humor nem sempre tem tradução.
- Saber o inglês é uma coisa, mas apreciar o humor é outra - disse ele em uma entrevista. Para seus fãs, um clube de comédia em inglês é um lembrete intimidante da separação cultural. Eles quase nunca vão, disse ele. - Eles veem todo mundo rindo e têm medo de se sentirem excluídos - Wong disse.
Na Baruch, as melhores risadas apareceram quando Wong, cujo nome verdadeiro é Xi Huang, brincou com esse choque de culturas. Por exemplo: sua piada sobre americanos tentando pronunciando seu nome "Xi".
- Zee? - disse Wong, arrancando gargalhadas. - Zy?
- Onze?
A multidão foi à loucura.
Deslizes culturais são tema nas comédias de imigrantes em Nova York, disse Oleg Boksner, um comediante do Brooklyn que está montando um monólogo chamado "Da Rússia, Com Risadas". Nele, ele se diverte com sua ascendência através de caricaturas, como alguém saído da Rússia comunista que tenta se misturar na tradição norte-americana do Halloween, mas assusta as crianças que pedem gostosuras ou travessuras com gostosuras ao estilo soviético: uma batata crua e uma cebola. "Teve gente do México que se viu nessa situação também", Boksner contou sobre o show. "É porque eles sabem como é ser um imigrante de um jeito ou de outro."
Mas quando ele atuou para uma plateia de visitantes russos no B.B. King Blues Club and Grill em Manhattan alguns anos atrás, essas piadas não fizeram sucesso.
- Eles não entendiam algumas das coisas que estava falando - Boksner disse. - Isso serviu para abrir meus olhos para o fato de que isso é uma coisa exclusiva de Nova York.
Geralmente, uma dada comédia cultural, quando transplantada para Nova York, evolui. Algumas vezes ela se torna americanizada - com uma irreverência que não ousaria usar em sua terra natal. Há dois anos, o Festival de Comédia Árabe-Americana de Nova York adicionou uma noite de "haram", ou piadas proibidas.
Temas como sexo e namoro, típicos na maioria dos clubes de comédia, mas mal vistos por muitos muçulmanos religiosos, são levantados lá, frequentemente com plateias que incluem mulheres, rindo à vontade debaixo das burcas tradicionais.
Ainda assim, algumas coisas vistas como inofensivas nas comédias norte-americanas são proibidas, e ser do lugar que você provoca pode ser útil em saber o que evitar - como piadas sobre "sua mãe" se a plateia for zambiana.
- Os pais são como deuses lá - disse Kasambwe Mpulamasaka, um imigrante que hoje vive em Dallas e já fez shows para a diáspora africana em Nova York.
Com algumas plateias conservadoras indianas, disse Dan Nainan, um comediante descendente de indianos e japoneses, palavrões e divórcio estão fora de cogitação. Nainan é um dos poucos comediantes que criaram um nicho ao se rotularem como "comediantes limpos", compartilhando com a audiência histórias e crenças que garantem que eles não se ofenderão.
A tapeçaria da comédia em Nova York não é tecida apenas pela nacionalidade. Chris Clark de Nova Jersey, outro comediante limpo, é o autointitulado Rei da Comédia Cristã. O site de Clark transborda de depoimentos de clientes satisfeitos e uma citação de um proverbio: "Um coração alegre serve de bom remédio".
Embora o stand-up seja a atração preferida em Nova York, nem sempre mexe com as plateias que podem ter crescido com modelos diferentes de comédia. O equivalente chinês do stand-up é chamado diálogo cômico, uma conversa divertida habitual entre dois artistas, geralmente usando roupas tradicionais. Quando Wong atua, alguns membros menos americanizados da plateia se perguntam onde estaria seu traje tradicional, explicou ele.
Plateias de imigrantes de algumas partes da África podem ter cultivado um gosto por stand-up ao crescer com o que Mpulamasaka chamou de "mafooling", uma competição de insultos na escola que é como uma batalha de rappers. Sarcasmo, por outro lado, não funciona.
- Não temos isso na Zâmbia - explicou.
E todo comediante estrangeiro precisa enfrentar a árdua tarefa de descobrir quais piadas não podem ser traduzidas. Por exemplo, a piada mexicana sobre a galinha que estava à beira da loucura. Por quê? Porque ela procurava um lápis, cercada de canetas! "Plumas" em espanhol significa "canetas", mas também, o que é crucial para a piada, "penas". Em inglês, não funciona.
The New York Times
Nova York oferece variedade de comediantes imigrantes
Piadas étnicas e deslizes culturais formam a receita das gargalhadas mais frequentemente utilizada por artistas estrangeiros na cidade americana
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