No ar como a vilã Mariane em Espelho da Vida, novela das seis exibida pela RBS TV, Kéfera Buchmann protagoniza o filme Eu Sou Mais Eu, que chega aos cinemas nesta quinta-feira (24). Com direção de Pedro Amorim, a comédia conta também com nomes como João Côrtes, Giovana Lancellotti e Felipe Titto no elenco.
Projetada pelo YouTube, Kéfera vive no longa uma cantora popstar arrogante que volta a 2004, quando tinha 16 anos, quando era mais introspectiva e vítima de bullying na escola.
Em entrevista a GaúchaZH, a atriz falou sobre Eu Sou Mais Eu e seu trabalho na atuação.
À primeira vista, Eu Sou Mais Eu parece ser uma comédia mais direcionada ao público adolescente. Porém, há bastante elementos que podem ser identificados por uma geração que viveu a adolescência em 2004. Para você, o filme tem algum público alvo?
Creio que não. Acho que é justamente sobre isso, gerar identificação de várias pessoas. Principalmente para a gente, que já passou da adolescência, uma pena, né? (risos). Nós acabamos nos identificando por ter vivido essa fase nos anos 2000. Toda a galera que passou por isso, do jogo da cobrinha, de ir à locadora, de ter discman, de não ter a tecnologia que temos hoje, vai se identificar. Por isso falo que não tem um público específico, pois o filme toca muito em todo mundo, desde a galera que não viveu o ano de 2004 e é adolescente hoje, e para uma galera mais velha.
Você tem 25 anos e vive no filme uma popstar na casa dos 30 e uma adolescente. Como você se preparou para viver idades diferentes?
Fizemos uma preparação bem intensa. Fiquei dois meses coma preparadora, e a gente construiu juntos. Foi um processo de muito estudo, de trabalho de corpo, de assistir referência, de leitura, de busca de animais para ter de referência para cada fase da Camila. No caso, ir imitando esse animal até a gente humanizar as atitudes desse animal. No começo do filme, a Camila tem um ar de soberania e de arrogância. Ela é muito frustrada e sozinha. Não que ela seja ruim, mas foi muito machucada na adolescência, o que influenciou a pessoa que ela se tornou no futuro. Então o animal que escolhi para a Camila adulta foi o leão. Você pega um animal a princípio pela imagem e comportamento e você vai descobrindo coisas que vão batendo na personalidade da própria personagem. Desde o olhar, comportamento do leão ser preguiçoso e esperar que a leoa vá buscar a comida, e a Camila seria o tipo de pessoa que, se está sentada em um lugar, e o celular toca a dois passos, ela com certeza pediria para alguém lhe alcançar o celular. Tamanha sua arrogância, "o mundo é mundo e tudo gira em torno do meu umbigo". O animal para a Camila adolescente foi um esquilo, que tem essa coisa de ter um olhar rapidinho e determinado, de ser pequeno e indefeso, mas ao mesmo tempo que sabe fugir dos predadores. Tenta ir atrás do que quer até ver que não dá mesmo. Eu assistia a documentários e depois ia para o trabalho de corpo no qual vira mesmo o animal e tenta humanizá-lo. Estrela Straus, preparadora de elenco e que interpreta uma fã maluca no filme, usa o método do Lee Strasberg. Foi uma preparação bem intensa para a gente chegar nesse resultado. Fiquei satisfeita com o resultado que saiu na tela.
O filme não segue um caminho fácil de romantizar Cabeça (João Côrtes) e a Camilla, focando na amizade entre os dois. Eu queria que você destacasse quais rumos do filme lhe deixaram satisfeita?
A solução final do filme não é encontrar o cara da sua vida, mas sim se encontrar com você mesma. Como sou produtora associada do filme, tudo foi muito bem pensando desde a primeira ideia, no início de 2017, quando começamos a trabalhar neste filme. Tudo eu participei muito ativamente. Gostei muito da mensagem que ele passa sobre você não se importar com a opinião dos outros, trabalhar para bancar sua autenticidade e deixar sua essência fluir. Apesar do mal que te fazem nessa época tão intensa que é a adolescencia, não deixar que isso não te torne uma pessoa dura e amargurada com a vida. Nós acabamos tomando um rumo e é importante que a gente vá se auto-trabalhando para não deixarmos as nossas frustrações e feridas transformarem a nossa personalidade e quem a gente vai ser no futuro.
Você se identifica de alguma maneira com a versão adolescente da Camilla?
A versão adolescente sou eu, retrata certamente o que vivi.
Você era introspectiva?
Nunca fui a popular. Na escola, sempre fui a esquisita, a bizarra, que sofria bullying na escola. Tem muito do que aconteceu comigo.
Se você pudesse voltar a viver ali a sua adolescência, como no filme, o que você faria de diferente?
Nada. Se eu tivesse a consciência de que faria este filme, acho que passaria por tudo de novo. Foi uma época muito cruel. Estudei nove anos em um colégio que foi bem complicado nessa questão. Eu chorava todos os dias. Não queria ir mais para o colégio, odiava muito estar ali porque as pessoas eram muito cruéis com assuntos ligados a cor, a cabelo, a usar óculos, a questão do meu jeito, da minha personalidade, tudo era motivo para tirar sarro. Como sei que muitas pessoas passam por isso e que meu alcance acaba tendo relevância na vida das pessoas que me acompanham, é muito importante para elas ouvirem essa mensagem e ajudar a passarem por essa fase.
Você faz uma vilã em um novela global ao mesmo tempo que estreia um filme. É o seu período de afirmação como atriz ou ainda há o que progredir?
As pessoas ainda têm esse preconceito e pensar: "Ah, uma menina que veio da internet, que fez um canal no YouTube e aproveitou disso para virar atriz de repente". Foi justamente o oposto. Quando entrei no YouTube, eu já fazia teatro há uns dois anos. Entrei com a ideia que as pessoas me vissem e talvez me chamassem para fazer algum teste. Tipo aquele negócio de esperar que tivesse um olheiro que me chamasse para fazer algum teste. Ao longo do tempo, isso acabou meio que rolando. Mas eu não esperava que, em paralelo, a história da internet e do canal iam acabar rolando junto. Aos poucos, conforme eu ia trabalhando, as pessoas vão vendo que não, não foi simplesmente um movimento de querer virar atriz de repente. Era uma coisa que eu queria desde o começo e agora está acontecendo de vez. Não era uma coisa momentânea. Eu tenho plena noção e muita garra e vontade de estudar e melhorar cada vez mais. Dentro da nossa profissão de ator/atriz quando a gente fala "estou pronto", você está totalmente errado e aí que você não entendeu nada. Nossa profissão é muito sobre a gente estar buscando melhorar e evoluir mais. Tem que sempre ler muito, assistir bastante filme, buscar referência e até mesmo a auto-análise, de buscar terapia e conhecer você mesmo como pessoa para dar vida a outro personagem. Tudo vai virando bagagem, e você vai criando estofo para dar vida aos papéis que você vai criando ao longo do tempo. Eu quero muito continuar estudando, nunca deixei de estudar e de me empenhar em atuar. Nossa, o amor da minha vida é atuar.
Como foi sua adaptação ao formato da novela? Teve dificuldades com ritmo de gravações no início ou já entrou voando?
Graças a Deus foi tudo bem. É realmente mais puxado e demanda bastante da gente. É como um relacionamento porque é uma obra aberta que dura meses, você não sabe como sua personagem termina e vai se surpreendendo com os capítulos. Como a personagem que estou interpretando (Mariane) tem sido muito gostosa de fazer, uma vilã cômica, sempre que vai chegando cena eu dou muita risada. Não acredito que a Mariane vai para esse lugar. Ou que vai pagar tal mico. É muito legal você assistir à novela quase junto com o espectador e ver toda a coisa sendo construída. Como já tinha feito cinema e muito teatro, a noção de câmera eu já tinha. Não teve nenhuma grande dificuldade. Lógico que existe cenas mais densas ou difíceis, mas sempre chego com o texto decorado para não me surpreender com nada.
De que maneira você acha que a Mariane foi evoluindo na trama?
Ela ainda está na mesma ideia inicial que era pegar o papel de Julia Castelo, que ela finalmente conseguiu. O projeto de vida que ela queria desde o começo da novela. Ela ainda tem a questão amorosa que é decidir se ela quer ficar com o Mauro César ou Marcelo.
Sua base de fãs na internet é composta por adolescentes. Com sua exposição na novela das seis, você tem sido reconhecida por um público mais velho?
Sim! Tem um público mais velho. Tem as senhoras, principalmente no mercado, quando você está fazendo feira. Eu gosto muito quando a pessoa não faz a menor ideia de nada da internet e se refere a mim como "a moça da novela". É muito legal ser reconhecida dessa outra forma. É a galera que não conhece nada do meu trabalho até hoje e passou a me conhecer pela novela. "Ah, agora que te conheci vi que você tem vídeos, que legal". É uma união de tudo. Quem me conhece na TV, acaba indo me ver na internet, e quem já me acompanhava acaba me assistindo na novela.
Que projetos você pretende tocar em 2019?
Este ano tem bastante projeto. O que posso adiantar é que vou rodar o filme do meu terceiro livro, Querido Dane-se, fazendo a protagonista Jussara. Vou lançar mais um livro, que falará sobre o lugar da mulher na sociedade, desde o feminismo como um todo, abordando autoaceitação, amor próprio, da masculinidade tóxica, a questão do machismo, entre outras. Será baseado em muito do que estudo, em paralelo com tudo que faço, com tudo que aprendi.
Você pretende atuar atrás das câmeras?
Eu gosto muito da ideia. Como sempre me envolvi muito nisso com o canal, de me envolver sozinha em um processo autodidata, conforme vou convivendo com os diretores nos meus trabalhos e aprendendo com o que eles me ensinam, é um lugar que me encanta muito. Tanto é que já fiz curso de cinema quando ainda morava em Curitiba, tanto é que uma das coisas que eu mais gostava era da direção de fotografia, sendo algo que sempre presto muita atenção. Mas isso é para quando eu for mais velha. Primeiro eu quero me consolidar como atriz.