Quando 2019 terminar, no dia 31 de dezembro, ela estará com 101 anos. Cada comemoração de Ano-Novo sempre se confunde com a celebração do seu aniversário, nesse mesmo dia, e foram muitos. Desta vez, não será diferente. Haverá uma festa junto a seus queridos familiares.
Dos sete irmãos, filhos do casal Pedro e Elza, ela é a única remanescente. Theo, Elvetia, Binia, Gertrudes, Edeltraud e Pedro Augusto já se foram. Dona Petronella Eggler Dockhorn resiste, amparada pelos cuidados da filha Irene e do neto Marcelo, com quem mora no bairro Auxiliadora, em Porto Alegre, e também por uma atividade manual e intelectual à qual dedica grande parte do seu dia, que se inicia às 7h30min e se encerra por volta das 20h, quando se recolhe.
No apartamento onde vive, próximo da igreja Auxiliadora, duas coisas não podem faltar: grandes cadernos (com espiral) e cola de bastão. Recheados de fotos, notícias e artigos publicados em Zero Hora, eles já são quase uma centena e meia, religiosamente confeccionados pela tesoura e pela paciência da anciã e guardados, com zelo, numa estante. Sim, na casa deles, quem quiser ler o jornal inteiro, é bom se adiantar, porque depois que ela senta para “trabalhar” e se distrair, a edição é retalhada.
Foi por sugestão de Irene que dona Petronella passou a colecionar recortes. Primeiro, de receitas culinárias, depois, como o caderno de gastronomia saía só uma vez por semana, de tudo o que lhe chamasse atenção ou que julgasse ser importante. A “terapia ocupacional” virou hábito sagrado. A idosa tem justo orgulho de se manter informada sobre o Grêmio, seu time do coração, ou sobre outro assunto qualquer por meio de colunistas como David Coimbra. — Esse diz o que pensa —, falou ela, com convicção.
Seu pai, Pedro Eggler, veio da Suíça, já formado em Medicina, para Monte Alverne, um distrito de Santa Cruz do Sul, na Região Central, onde atuou como médico e fundou um hospital. Acompanhado da esposa Elza, que lhe auxiliava em partos e cirurgias, ele partia a cavalo para atender os pacientes nos confins do Interior.
Petronella, aos 10 anos, foi estudar no internato protestante. Depois, morou com a avó Guilhermina, mãe de Elza, com quem ia sempre ao cinema. Aos 22 anos, ela se casou com Walter Dockhorn, comerciante, lavoureiro e industrial de uma fábrica de laticínios. Eles tiveram quatro filhos: Pedro, Elisa, Irene e Roberto. Em 1955, vieram para Porto Alegre, pois Walter tinha que comandar a empresa Germano Dockhorn, que pertencia a sua família. O casal visitou a Alemanha e outros países da Europa em três ocasiões. Já faz 21 anos que oma (vó em alemão) Petronella ficou viúva. A vida tinha que seguir, e seguiu. Ao som ambiente de André Rieu, vó Petronella recorta e cola.