Em dezembro de 1963, o historiador, poeta, jornalista e escritor Walter Spalding (1901-1976), relembrou, nas páginas da Revista do Globo nº 861, a trajetória do pintor e desenhista Francis Pelichek (1896-1937), que marcou a arte do nosso Estado nas décadas de 1920 e 1930. Pelichek nasceu na Tchecoslováquia e chegou a Porto Alegre alguns anos depois de terminada a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Logo, tornou-se professor do Instituto de Artes, de 1922 até sua morte.
Segundo Spalding, embora “baixote em consequência de defeito físico, mas sem recalques”, o moço “simples, modesto, sempre disposto” conquistou rapidamente, e por inteiro, o mundo artístico e intelectual da Capital. Era boêmio e amigo de gente como Ângelo Guido, Fernando Corona, Francisco Bellanca, Maristany, Sotero Cosme, Tasso Corrêa, Mario Quintana, Athos Damasceno, Ernani Fornari, Vargas Neto, Teodomiro Tostes, Augusto Meyer, Mário Totta, João Fahrion, personalidades da época em Porto Alegre.
Aqui, seu trabalho mudou de rumo e, ainda segundo o autor da reportagem, “o classicismo europeu que trazia consigo despareceu para dar lugar a um estilo novo, genuinamente sul-rio-grandense, gauchesco”. Pelichek apaixonou-se pelo Estado, por sua paisagem e seus costumes. A obra dele passou a interpretar “a vida campeira e colonial, às vezes tocada de certo humor muito natural nele, que fazia da vida, apesar da sua pobreza, motivo de satisfação não apenas para si, como que se vingando do defeito físico, mas para quantos o rodeavam. Todo o Rio Grande do Sul vibra e vive em suas novas telas, a partir de 1925, mais ou menos”, afirma Spalding.
Quando o pintor morreu, humilde e modestamente, a imprensa registrou que ele era “um grande artista, uma nobre criatura, que tão cedo não será esquecido por aqueles que tiveram a ventura de conhecê-lo e privar com ele”. Em meados de 1936, meio adoentado, foi aconselhado a deixar de beber. “Ora, deixar logo o que de melhor tem a vida?!”, respondia. Mas, como para viver era preciso que deixasse, deixou, não sem antes desabafar a sua mágoa: “Supremo sacrifício...”.