Cientistas gaúchos e catarinenses estão pesquisando com mais intensidade os meteotsunamis, ou tsunamis meteorológicos, que passaram a ser registrados com alguma frequência nos litorais Sul e Médio do Rio Grande do Sul e em Santa Catarina nas últimas décadas, causando estragos na região costeira. O meteotsunami é uma onda com característica similar ao tsunami comum, aquele induzido por atividade sísmica no oceano. A diferença é que ela é originada por fenômenos atmosféricos, causados pela variação da pressão atmosférica, associada à passagem de uma linha de instabilidade sobre a costa.
Um dos meteotsunamis em estudo formou uma onda que atingiu 40 quilômetros de extensão de costa, indo da praia do Farol, em Tavares, passando por Balneário Mostardense e chegando a São Simão, em Mostardas. Ele ocorreu por volta das 3h da madrugada de 23 de setembro de 2018. A força da onda entortou postes, derrubou casas de madeira e de alvenaria próximas à faixa de areia e deixou outras parcialmente destruídas. Onde não havia dunas frontais, a água cruzou vias e sangradouros e acabou invadindo a área de moradias, distante cerca de 200 metros da praia. Não houve vítimas pelo fato de o fenômeno ter ocorrido fora do período de veraneio.
Susto na madrugada
Na praia de São Simão, segundo levantamento realizado por pesquisadores ligados à Universidade Federal do Rio Grande (Furg) e da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), quatro casas foram destruídas completa ou parcialmente durante o meteotsunami ocorrido na madrugada de 23 de setembro de 2018. Dunas foram cortadas, postes, derrubados, e eletrodomésticos acabaram indo parar no mar. Pescadores contam que o mar silenciou na madrugada e, de repente, veio a onda, por volta das 3h.
Veraneando há uma década no local, a professora aposentada Cátia Fraga, 52 anos, e o bancário Marcelo Barbosa, 56, tinham retornado a Santo Antônio da Patrulha na tarde anterior ao fato. No meio da madrugada, porém, foram acordados por um vizinho. A casa deles fica a cerca de 150 metros da praia.
— Ele disse que uma onda tinha vindo até aqui (na residência) e havia destruído uma boa parte da nossa casa. Quando chegamos, vimos muita areia dentro dos cômodos. A onda quebrou uma parede, destruiu todos os móveis de MDF e os eletrodomésticos foram todos arrastados para uma das pontas da casa. Encontrei peixes dentro do vaso sanitário. Foi assustador. Mas tivemos muita ajuda da comunidade para tirar a areia de carrinho de mão — recorda Cátia.
Barbosa lembra que o mar avançou pela Rua Luiz Carlos Cardoso Vieira, onde não havia duna frontal, por pelo menos 200 metros:
— Os moerões que estavam no pátio foram arrastados até o mar. Metade da porta da casa foi arrancada. Foi um tumulto.
Cátia e o marido reconstruíram a casa. A rua que dá acesso ao mar e por onde a água avançou até a área habitada está, atualmente, fechada por uma duna frontal.
Móveis no mar
Estava decidido que a família Stobienia, de Nova Santa Rita, passaria alguns dias na casa de veraneio, no Balneário Mostardense, em setembro de 2018. Porém, o especialista em manutenção elétrica Leandro Stobienia, 65 anos, decidiu abortar a ida em cima da hora.
Hoje, ele comemora a mudança de planos. Com a força da onda, a parte frontal da casa de alvenaria da família foi totalmente destruída, restando apenas uma parede lateral e a dos fundos em pé. Um sofá-cama que costumava ter alguém da família sempre dormindo foi esmagado por uma das paredes que caiu sobre ele.
— A água fez a volta pela casa, foi até o cômoro do fundo e limpou tudo, deixou sem dunas na frente. Saíram todas. Meus móveis, a porta e a janela andaram 500 metros e foram parar no mar. A geladeira foi parar nas dunas, a 50 metros de distância. Foi uma onda só, que foi até a quinta quadra do bairro — conta.
Stobienia reconstruiu a residência. Desta vez, de madeira. As dunas frontais foram recuperadas com o passar dos anos e a força dos ventos. Ele garante se sentir mais seguro de continuar no local.
Na área central do Balneário Mostardense, as dunas frontais ajudaram a diminuir o impacto da onda. Mesmo assim, o comerciante Julio Dias, 53 anos, que mantém um restaurante próximo da praia, lembra de que na noite anterior havia um vento forte e faltou luz:
—De manhã, quando acordamos, as dunas estavam mais compactas. E na frente da casa tinha resto de lixo e de redes. Em cima das dunas, com cerca de 20 metros de altura, havia peixes mortos. A casinha do salva-vidas foi arrancada e foi parar lá adiante. Onde tem sangradouro, a onda andou uns 100 metros para dentro do balneário.