Apenas alguns sortudos viram a primeira neve do ano em São José dos Ausentes. Ela caiu por volta das 13h de sexta-feira, mas somente em alguns pontos isolados no interior do município. Encorajados pela previsão de que o fenômeno se repetiria entre 18h de sexta e 6h de sábado, muitos turistas ligaram para pousadas e hotéis da região, que ficaram lotados no fim de semana. Mesmo sem neve, visitantes encantaram-se com o frio e as belezas da região.
Entre os sortudos que testemunharam a neve estavam o mecânico Michel Spengler, 25 anos, e a estudante Gabrielle Zimmermann, 21 anos. Vindos de Feliz, os dois celebravam dois anos de namoro.
– A gente tinha recém chegado na pousada. Só deu para terminar de almoçar e correr para a rua que a neve começou – contou Gabrielle, que nunca tinha visto o fenômeno.
– Foi branco mesmo! Mas não chegou a branquear o chão – completou Michel.
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Em um passeio de cavalo na beira dos cânions da região, os dois comemoraram a sorte de ver a neve, que caiu por apenas 40 minutos no terreno da Pousada Fazenda Monte Negro, onde estavam hospedados. A maioria dos turistas chegou mais tarde ou sábado e perdeu o momento, mas muitos não pareciam se importar. Era o caso da secretária Léia Blanke, 33 anos, e do motorista Jefferson Dornelles, 31, de Canoas.
– A gente veio pela neve e para descansar um pouco, sair da muvuca da cidade. Então, procuramos um lugar bem deserto e aconchegante. Se não nevar mais, continua tudo ótimo. Tem sopa, chocolate quente, fondue – comemorou Léia.
Aparição do sol garante visibilidade nos cânions
Se não teve neve, o sábado presenteou os turistas com os primeiros raios de sol em quase duas semanas de chuva, garantindo boa visibilidade nos cânions. No Pico do Monte Negro, ponto mais alto do Estado, com 1.403 metros de altura, era possível ver o mar e a cidade de Torres. Ao lado, estão os outros dois morros mais altos do RS, o Cruzinha e o da Boa Vista, onde o silêncio só é quebrado pelo vento nas araucárias.
Os cânions, como o de Monte Negro, Realengo e Boa Vista, são a principal atração da região da Serra Geral, com 107 quilômetros de paredão. Outra paisagem que hipnotiza turistas são as coxilhas dos campos de altitude, onde tudo que se vê são as sombras de nuvens passeando com vacas e ovelhas.
A natureza praticamente intocada e o isolamento atraíram o biólogo aposentado Vitor Hugo Travi à região. Ele vive em Canela, mas visita o local durante todo o ano para estudar as transformações na vegetação.
– É um dos lugares mais bem preservados do Estado em termos de natureza porque a densidade demográfica é bem baixa. Se você quer encontrar natureza intocada, o melhor lugar é aqui – diz o estudioso.
Pouca conectividade, solidão e rusticidade
Ao contrário de outras cidades turísticas da Serra, São José dos Ausentes é um lugar para quem gosta de solidão e rusticidade. O sinal de celular é fraco, e o viajante vai depender de si mesmo para achar os pontos turísticos – o município não conta com agências de turismo. O centro da cidade oferece pouco ao visitante: não espere lojinhas nem restaurantes requintados. Quando o sol se põe, todos se recolhem. Por esse motivo, os dois hotéis da cidade ainda tinham vagas, enquanto todas as pousadas rurais da região estavam lotadas no fim de semana. Os turistas preferem essas hospedarias – 16, no total – que oferecem a chance de aprender as lidas de fazenda e andar a cavalo.
– O turismo aqui é essencialmente de fazendas que abriram as suas portas para que o visitante possa experimentar como é viver em um local assim – explica a secretária de Turismo do município, Aline Ramos. – As famílias trazem as crianças de cidade grande para conhecer a vida no campo, porque elas só conhecem o leite da caixinha, não sabem de onde vem o ovo.
A região recebe gente de São Paulo, Paraná e Santa Catarina, em busca do clima de montanha e da cultura gaúcha. As pousadas não deixam faltar chimarrão, fogão a lenha e pinhão assado na chapa, embalados por música nativista. Já as famílias aproveitam para levar as crianças ao convívio dos animais de fazenda, como galinhas e ovelhas, além dos típicos da região, como o cavalo crioulo e o gado franqueiro.
Algumas pousadas, como a Fazenda Vó Angelina – construída a partir de uma propriedade de 1910 –, aproveitam para resgatar a história da região com curiosidades, como uma sala de pouso dos tropeiros e um saladeiro de charque, além de organizar cursos de fiar lã e guasquear. O município integrava o caminho dos tropeiros (rotas que ligavam o sul do Brasil a Sorocaba) e seu nome remonta ao século XVIII, quando proprietários de grandes sesmarias morreram sem deixar herdeiros, levando ao “juízo de ausentes”. Na paisagem, a marca dessa história são as taipas e os mangueirões de pedras.
Recentemente, a região tem atraído também ciclistas, que pedalam em grupo ou sozinhos. A secretária de Turismo de São José dos Ausentes conta que os dados oficiais indicam apenas 4 mil turistas anuais no município, mas que a taxa real está mais próxima de mil turistas por mês. Segundo ela, há uma média de 600 leitos no município.
Em vídeo, confira algumas atrações de São José dos Ausentes: