Apaixonado por Fernando Pessoa, Marco Aurelio Kunst, 27 anos, trocou o emprego em uma fábrica de bombachas pelo de facilitador de leitura. O ofício foi criado há cerca de um ano para incentivar a circulação de livros na Penitenciária Modulada Estadual de Montenegro, onde 1.423 homens e 89 mulheres estão presos em regime fechado.
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Como, por medida de segurança, os presos não podem circular pelas galerias até as salas de leitura para buscar obras, a penitenciária desenvolveu o emprego para 12 presos - 11 homens e uma mulher. Eles são responsáveis pela seleção dos livros e distribuição nas celas. O objetivo é encher uma caixa de feira com as obras e voltar de mãos vazias.
Para isso, Kunst e seus colegas atuam como vendedores de palavras. Indicam as obras de que gostaram, coletam relatos dos leitores e oferecem livros individualmente conforme o perfil dos presos. Com os facilitadores, dos cerca de 900 livros que a penitenciária tem, 540 estão emprestados atualmente.
O trabalho tem um benefício muito atrativo: reduz a pena. Cada três dias como facilitador de leitura representam um dia a menos na prisão.
- A leitura para nós é muito gratificante, porque, apesar de todas as coisas ruins que estamos passando aqui, os livros nos trazem pensamentos bons. Diminuem a sensação de estar preso - afirma Kunst, que está no local há cinco anos.
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Entre os livros que fazem mais sucesso na sua galeria, onde apenas três dos mais de cem detentos concluíram o Ensino Médio, estão os religiosos, os de poesia, os de Machado de Assis e os de Paulo Coelho.
O maior cliente dos facilitadores é José Batista da Silva, 55 anos. Preso desde 2012, ele trabalha na cozinha do estabelecimento e devora um livro por semana.
- Li bastante romance, como Jorge Amado, mas gosto mesmo é dos religiosos, que falam de Deus - comenta o detento, um dos inscritos para o Enem deste ano.
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O público feminino tem um gosto diferente. Entre os favoritos, estão os romances, os livros sobre a educação dos filhos e os de autoajuda. Entre as mulheres, só há uma facilitadora. Ela tem 25 anos, é mãe de um menino de sete anos e preferiu não ter o nome divulgado. Presa há um ano, ela relata que a preferência pelas histórias de amor tem um motivo: os relacionamentos conturbados que levaram a maioria delas ao cárcere.
- Gostaríamos de ter aquela vida que o livro está contando, e isso serve de inspiração para nossa conduta lá fora. Serve para mudar o conceito em relação aos companheiros e ter uma oportunidade para mudar de vida - conta.
A LEITURA NA PRISÃO
- O RS tem 31.279 presos, sendo 29.538 homens e 1.741 mulheres
- O Banco de Livros já doou 132.998 obras a 95 dos 105 presídios do Estado
- O homens preferem ler títulos religiosos, de poesia e de literatura brasileira
- Já as mulheres escolhem romances, livros de autoajuda e sobre os filhos
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Fernanda da Costa
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