![Mateus Bruxel / Agencia RBS Mateus Bruxel / Agencia RBS](https://www.rbsdirect.com.br/filestore/6/7/9/0/4/1/5_be9e45737bf7aec/5140976_c3a2a006d8a6f97.jpg?w=700)
A cidade ferveu nesta semana. Não é um exagero retórico. Porto Alegre, de fato, derreteu sob um calor que chegou sem pedir licença, mas avisou antes que viria. Ele não quer saber em quem você votou, se você torce para o Inter ou para o Grêmio, se você acredita em Deus e qual é sua opinião sobre mudanças climáticas. O calor simplesmente existe. E sobre ele, ninguém pode discordar.
Não há margem para os aloprados que enxergam a Terra plana, ou para discutir se o 8 de outubro foi ou não uma tentativa de golpe.
Não vi, ouvi ou li, pelo menos até agora, alguém dizer que vivemos, de fato, uma onda de frio.
Assim como a enchente de meses atrás, a onda de calor se impôs sobre tudo e sobre todos. Não há versões ou discórdia, há apenas sensação. A sede, a irritação, a busca por sombra. Todos compartilhamos as mesmas dores diárias: o ar-condicionado que não dá conta, o desânimo e a insônia das madrugadas quentes. De repente, o que nos separa — política, opinião, crenças — perde espaço para o que nos une: o desejo simples de um vento fresco, de um gole de água gelada, de um respiro em meio ao concreto superaquecido.
Aprendi, muito tempo atrás, que existem alguns temas seguros para iniciar uma conversa, para quebrar o gelo, com o perdão pela metáfora fria. Seja em uma reunião de trabalho ou no elevador. Falar sobre o tempo é um deles. Risco zero. Ninguém se ofende.
Nunca foi tão fácil iniciar uma conexão, mesmo com um desconhecido. “E esse calorão, hein?”.
Já a natureza tem sua forma particular de diálogo. Ela primeiro avisa, sutilmente. Podemos ignorar suas mensagens por um tempo, mas elas continuarão vindo, cada vez mais fortes, cada vez mais urgentes. Até que o diálogo acaba. O calor desta semana e as águas de antes são avisos — não um discurso ideológico, não uma pauta específica, mas um alerta de que há grandes forças insubordinadas às nossas pequenas disputas.
Agora, outra vez, não nos falta assunto. “E esse calorão, hein?”.
Nossa forçada união se chama suor e desconforto.