Jair Bolsonaro é um homem adulto e confia nos seus médicos. Por isso, não há qualquer problema no fato de ele, contaminado pelo coronavírus, tomar cloroquina. Para mim, se ele acha que funciona e está consciente dos riscos – o que parece ser o caso – poderia tomar no café, no almoço e na janta. Tanto faz.
O que se discute nesse momento não é o direito do presidente de usar a cloroquina, mas a propaganda que ele faz do medicamento. Li e reli dezenas de artigos e conversei com especialistas: não há comprovação da eficácia do tratamento. Se fosse só isso, seria bem menos grave. A questão são os efeitos colaterais, especialmente nos corações de alguns pacientes. Mas precisamos separar as coisas, até para que elas tenham legitimidade. O presidente pode tomar cloroquina. É um direito dele, se acreditamos de verdade na liberdade do indivíduo. O que ele não deveria fazer é receitá-la e reafirmar a sua eficácia. "Eu confio, e você?", chegou a declarar, como se fosse o garoto-propaganda de comercial dos anos 80.
Em vez disso, seria mais responsável assumir a ingestão do remédio como uma posição privada e pessoal, além de aconselhar os cidadãos a conversarem com seus médicos antes de qualquer decisão. Ao usar a cloroquina como bandeira, Jair Bolsonaro faz aquilo que mais gosta na arena política: provocar e gerar reação. Com isso, segue banhado pelos mesmos holofotes que garantiram a sua eleição. Nesse cenário, que nada tem a ver com medicina, o efeito da cloroquina é altamente positivo para o presidente.