As cenas de brasileiros enrolados na bandeira verde e amarela hostilizando ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em Nova York são reveladoras do primitivismo para o qual descambou a militância bolsonarista. Ninguém é obrigado a gostar de decisões judiciais, mas no Estado Democrático de Direito não é aceitável que ministros ou qualquer cidadão sejam impedidos de circular por militantes inconformados com o resultado da eleição. O máximo que esses aloprados com dinheiro para circular pela cidade mais conhecida dos Estados Unidos conseguem é alguns minutos de fama nas redes sociais, passando vergonha em dólar.
A campanha difamatória contra os ministros do Supremo vem de longe, estimulada pelo presidente Jair Bolsonaro ao longo do seu mandato. As iniciativas do ministro Alexandre de Moraes para evitar que as fake news contaminassem o processo eleitoral fizeram dele o alvo preferido dos grupos radicais.
É fato que Moraes cometeu alguns exageros na tentativa de controlar a incontrolável internet, mas os ataques não se restringem a ele: outros ministros do Supremo vêm sendo sistematicamente agredidos ou têm cerceado o direito de ir e vir por arruaceiros que se julgam no direito de agredir, ameaçar e decidir quem pode e quem não pode andar na rua — no Brasil ou fora dele.
Antes e depois da eleição ocorreram episódios que ilustram esse atropelo da lei por "patriotas" de passeata. Quando era presidente do Supremo, o ministro Luiz Fux teve de cancelar uma palestra em Bento Gonçalves por ameaças a sua segurança. Dias Toffoli precisou fazer por vídeo uma conferência que seria presencial, em Gramado, porque empresas e pessoas físicas boicotaram sua presença. Recentemente, Luis Roberto Barroso foi hostilizado quando jantava em um restaurante de Porto Belo, Santa Catarina.
Às vésperas da eleição, a ministra Carmen Lúcia foi moralmente atacada por Roberto Jefferson, o que rendeu ao ex-presidente do PTB a volta à prisão em regime fechado — e ele recebeu a tiros os agentes da Polícia Federal que foram cumprir a ordem judicial.
Agora, em Nova York, as hostilidades atingiram Moraes, Barroso e Gilmar Mendes, que estão na cidade para participar da Lide Brazil Conference, com o tema O Brasil e o Respeito à Liberdade e à Democracia.
Não são apenas os ministros do STF os alvos dos bolsonaristas incapazes de aceitar o resultado da eleição. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o deputado federal eleito Lindbergh Farias foram hostilizados em um restaurante em Brasília. Os "patriotas" que se julgam no direito de xingar quem pensar diferente deles agem como criminosos que delimitam um território e decidem quem pode e quem não pode entrar na área.
ALIÁS
Depois de fracassada a tentativa de virar a mesa e anular o resultado da eleição, parte dos manifestantes acampados em frente aos quartéis mudou o discurso: diz que o protesto é contra a censura e pede o impeachment de Alexandre de Moraes.