
Com o comitê científico que o assessora dividido entre os que defendiam o levantamento das restrições às aulas presenciais e os que preferem manter as escolas fechadas, o governador Eduardo Leite precisou bater o martelo e arcar com o ônus das críticas inevitáveis. Não se tratava de decidir apenas a partir de que momento autorizar a volta às aulas, mas definir o cronograma e decidir o mais delicado: por onde começar.
Além de ouvir especialistas em saúde e educação para firmar convicção sobre o melhor caminho a tomar, Leite varou noites lendo artigos publicados em diferentes partes do mundo e concluiu que jamais haveria consenso.
Três integrantes da equipe do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta foram consultados regularmente nos últimos meses: Erno Harzheim, Wanderson Oliveira e João Gabbardo dos Reis. A coordenadora do Comitê de Dados, Leany Lemos, também mergulhou em estudos internacionais e mapeou o que vem sendo feito em outros países em busca de subsídios, mas acabou constatando que a realidade de cada país é incomparável.
Na falta de uma fórmula para ser copiada, Leite optou pelo calendário flexível, que se molda à realidade de cada município, dando autonomia aos prefeitos para decidir e deixando a critério dos pais mandar ou não os filhos para a escola.
Nesta sexta-feira (4), em Passo Fundo, Leite repetiu o que vem dizendo nos últimos dias quando perguntam se não é cedo demais para liberar as escolas:
— Não existe consenso sobre o momento de voltar. Nós entendemos a educação como um serviço essencial. Há especialistas que dizem até que seria preferível manter o comércio fechado por mais tempo do que as escolas.
Leite lembrou que há estudos indicando que nas férias as crianças perdem parte do que aprenderam. Com seis meses de paralisação, os prejuízos serão inevitáveis:
— As crianças perdem ritmo, vocabulário, destreza. Estudos apontam que no mundo inteiro há crianças sofrendo de estresse pós-traumático após longo período de confinamento.
Esse é um dos principais argumentos de Harzheim para defender a retomada gradual das aulas, desde que o sistema hospitalar da região não esteja sobrecarregado. Nas demais, o entendimento é de que, estando em bandeira laranja e amarela, é possível reabrir as escolas, desde que respeitados os protocolos de higiene e distanciamento.
— A preocupação não é só com a saúde física das crianças, mas também com a mental. Temos relatos de aumento da ansiedade, da depressão e da violência doméstica — relata o ex-secretário do Ministério da Saúde, defensor da tese vencedora no governo de retomar as aulas pela Educação Infantil.
Ainda que tenha pesado na balança do Piratini a pressão dos donos de escolas, que estão quebrando por não conseguir manter os compromissos, pesaram bastante os argumentos de Leany Lemos, sobre a necessidade de oferecer aos pais que precisam voltar ao trabalho um local seguro para deixar os filhos.
Leany tem especial preocupação com as famílias de baixa renda e com as mães que criam os filhos sozinhas e que têm renda inferior a um salário mínimo. Esse também é um dos motivos que levam Harzheim a recomendar que a Educação Infantil, que não é obrigatória, volte antes:
— Sem creches, muitas famílias estão recorrendo a improvisos em que as crianças correm muito mais risco do que se estivessem na escola, supervisionados por um profissional preparado.
Aliás
A discussão sobre retomar ou não as aulas em Porto Alegre acabou superada pela realidade da pandemia: no mapa preliminar das bandeiras, a Região Metropolitana saiu de laranja para vermelho, o que indica alto risco e impede a reabertura das escolas.