
2006 foi um ano e tanto para a América Latina. Depois de sobreviver a um golpe de Estado, voltar nos braços do povo ao poder e ser referendado para concluir o mandato, o tenente-coronel Hugo Chávez, ele mesmo autor de uma quartelada fracassada em 1992 contra o presidente Carlos Andrés Péres, foi reeleito presidente da Venezuela. Estava vitaminado por uma máquina assistencialista que lhe garantiu apoio popular, mas que pouco alterava as características da pobreza em seu país encharcado de petróleo.
Chávez surfou na marola esquerdista do continente para esticar seus tentáculos além-fronteiras. Elegera Evo Morales na Bolívia, em 2005. Naquele 2006, o bolivarianismo tentou fazer escola no Peru: Ollanta Humala chegou ao segundo turno, mas perdeu para Alan García. Cobri aquela eleição e, naquele ano, mergulhei na América Vermelha.
O engano de Chávez foi pensar que o movimento de esquerda na América Latina era uniforme. Nunca foi – e está aí Gabriel Boric, no Chile, para comprovar. Há diferentes tons, mas é possível distinguir aquela que reverbera o chavismo-madurismo, o orteguismo, além, claro do castrismo, e aquela que é capaz de reconhecer erros e se reinventar, sem abrir mão da ideologia, que reivindica igualdade, direitos humanos e não tergiversa perante o arbítrio - de nenhum matiz ideológico.
O asilo concedido a Nadine Heredia, ex-primeira-dama, mulher de Humala, condenada por corrupção em um processo envolvendo o governo da Venezuela e a construtora Odebrecht e que ganhou asilo no Brasil, tem resquícios da primeira fraternidade: da velha esquerda com cheiro de naftalina.