
Em 2022, o Rio Grande do Sul importou US$ 2,7 bilhões da Argentina. Superamos São Paulo e Santa Catarina como principal destino dos produtos dos hermanos. Compramos, principalmente, veículos, e vendemos peças para automóveis e máquinas e polietileno. Diante de um comércio muito ativo, é fundamental que os gaúchos comecem a se preocupar com o que ocorre do outro lado da fronteira. A crise argentina, por exemplo, foi uma das responsáveis pela queda na produção da indústria no Estado no início do ano.
As ideias de Javier Milei, vencedor das prévias no domingo (13), preocupam o mercado, que já deu uma amostra da hecatombe econômica que pode vir no país vizinho se ele chegar à Casa Rosada.
Cabe, de antemão, uma diferença fundamental: a direita tradicional, representada pela coalizão Juntos por el Cambio, acredita no livre comércio, na globalização e na democracia. A direita radical, de Milei, despreza as instituições e os princípios liberais que vigoram no mundo com mais força há pelo menos 70 anos. Milei pode ser um nome novo por aqui, mas o molde a partir da qual foi criado é o mesmo que deu origem a figuras populistas emergidas a partir do descrédito dos políticos em geral, no Brasil, nos Estados Unidos, na Polônia e na Hungria. A fórmula é conhecida: alguém que, da noite para o dia, se apresenta como um outsider, um salvador da pátria que vem "de fora", supostamente blindado da corrupção, para combater "as más práticas da política tradicional".
Milei fala em dolarizar a economia, fechar o banco central e acabar com o Mercosul. Tais ideias, obviamente, não seriam bem-vindas para os empresários gaúchos porque geram insegurança. Milei seria um presidente imprevisível. E tudo o que empresários abominam é imprevisibilidade.
Para o setor produtivo brasileiro, a torcida é pela direita tradicional, de Patricia Bullrich, que ficou em segundo lugar nas prévias. Os empresários gaúchos tendem a olhar com desconfiança para o governo de Alberto Fernández e, principalmente, para a vice Cristina Kirchner, que consideram esquerda radical. Bullrich, por exemplo, defende a integração energética e de infraestrutura nas fronteiras e padronização de normas técnicas para facilitar o trânsito de mercadorias.
É claro que o governo brasileiro preferia a continuidade da esquerda no poder, com a eleição do ministro da Economia Sergio Massa, mas as prévias já mostraram que os argentinos darão um poderoso "não" ao kirchnerismo. A proposta do "anarcocapitalista" de acabar com o Mercosul ameaça implodir o projeto de integração regional do governo Lula.
Milei é fruto do fértil terreno da frustração de um povo, que não vê saída da disfunção de seu país dentro da política normal.