A reunião iniciada nesta quinta-feira (9), de forma virtual, em Washington, é mais uma das cúpulas do presidente Joe Biden neste primeiro ano de mandato, na tentativa de recolocar os Estados Unidos na liderança do sistema internacional. Mas é mais do que isso: o debate sobre democracia, tão necessário quando o do aquecimento global, ocorre em um momento crucial da história contemporânea, quando a liberdade de expressão, de imprensa e direitos individuais e políticos, estão se deteriorando mundo afora.
No discurso de abertura do encontro, na manhã desta quinta-feira (9), Biden fez uma defesa contundente do trabalho da imprensa como fiscalizadora do poder público, prometendo fundos para garantir o jornalismo independente e para proteger quem denuncia a corrupção.
- No mundo todo, a imprensa livre está sob ataque - disse.
Além de um fundo para proteger a imprensa livre, Biden defendeu a presença de mais mulheres e pessoas LGBTQIA+ na política.
Tendo à frente um telão com as imagens de vários participantes, o presidente americano iniciou sua fala afirmando que renovar democracia requer esforço constante. Nas entrelinhas, referiu-se à experiência dos Estados Unidos, prometendo "liderar pelo exemplo".
Poucas vezes os americanos chegam com "telhado de vidro" a um encontro como esse. E, não obstante, é o que ocorre.
Nos últimos anos, a democracia americana recuou, em parte pela atitude pessoal do ex-presidente Donald Trump, que flertou com líderes autoritários no Exterior e, internamente, propagou desinformação e insuflou grupos extremistas- cujo ápice foi a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro, no maior teste de força das instituições americanas desde a Guerra Civil. Incrivelmente, muitos políticos da oposição, dentro e fora do Congresso, ainda hoje questionam a legitimidade da eleição de 2016 e a vitória de Biden.
Ao longo da segunda metade do século 20, os Estados Unidos exportaram seu modelo de democracia liberal, por vezes à força. Mas antes mesmo de Trump esse "liderar pelo exemplo" vinha sendo questionado - em grande parte, a partir da invasão do Iraque e os episódios de tortura subsequentes. A democracia mais tradicional e consolidada do mundo mostrou também seu lado obscuro.
Em relação à política internacional, Biden afirmou que autocratas tentam avançar com seus poderes no mundo. O discurso, de não mais do que 10 minutos, foi um recado a países onde a democracia está se deteriorando, como Hungria, Turquia, Venezuela, Nicarágua e Haiti, por exemplo.
Por um lado, Biden deu um recado a nações não convidadas - China, Rússia, adversários geopolíticos fundamentais dos Estados Unidos no século 21; e a países com os quais os americanos têm relações políticas e comerciais próximas, mas também são liderados por déspotas - como Egito, Arábia Saudita e outras petromonarquias do Golfo Pérsico. Biden perdeu uma oportunidade de fazer uma mea culpa histórico: quantas vezes, os Estados Unidos apoiaram grupos políticos que impuseram ditaduras mundo afora - em especial na América Latina. E também não explicou por que, nações ditatoriais, ou em vias de se tornarem autocracias, foram convidadas por Washington - como República Democrática do Congo, Iraque e Paquistão - para o evento desta semana.
Dificilmente, esses grandes encontros geram algo concreto, mas são frestas que contribuem para ampliar o debate - a própria cúpula do clima de certa forma antecipou um ambiente positivo para as resoluções da COP26. A expectativa é de que líderes anunciem novos compromissos, reformas e iniciativas durante o evento.