O excesso de reuniões de cúpula dos últimos meses (do G20 a COP26, sem falar nos encontros convocados pelo pelo presidente Joe Biden em seu afã de demostrar que os Estados Unidos estão de volta ao jogo internacional) pode produzir uma falsa sensação de que a reunião entre o líder americano e o chinês, Xi Jinping, ao que tudo indica na próxima segunda-feira (15), será apenas mais uma do calendário desse interminável 2021.
Não é.
Desse encontro depende boa parte do que entenderemos das relações econômicas e políticas globais pelos próximos anos. Melhor seria uma reunião presencial, olho no olho. Mas a pandemia não acabou - e Xi tem evitado aceitar convites presenciais fora da China. Será por videoconferência mesmo que os líderes das duas maiores economias do planeta irão se enxergar.
Xi chega vitaminado ao encontro, depois de ser alçado, na quinta-feira (11), pelo Comitê Central do Partido Comunista Chinês (PCC), ao mesmo patamar de Mao Tsé-tung e Deng Xiaoping. Na resolução histórica, o Politburo diz que, com Xi, a China teve "conquistas e passou por uma transformação histórica". E, como a quem mais é dado, mais é exigido, está depositada sobre suas mãos a missão de tornar o país a maior potência do sistema internacional.
Sim, estamos falando do maior desafio à ordem internacional liberal construída pelos Estados Unidos a partir da Segunda Guerra Mundial. E Biden chega pisando em ovos, com problemas internos e externos que fizeram despencar sua popularidade em 10 meses.
A saída turbulenta do Afeganistão põe em dúvida o comprometimento americano com aliados. Imagine o que os taiwaneses pensaram ao verem as cenas de afegãos em fuga no momento em que o Talibã se aproximou de Cabul? Poderiam esperar apoio americano quando o Exército de Libertação do Povo cruzar o Estreito de Taiwan?
O discurso da Casa Branca sobre esse que é ponto mais sensível da segurança internacional hoje no planeta- e que pode levar o mundo a um confronto entre titãs - é ambíguo. Nas últimas décadas da Guerra Fria, ao explorar a ruptura sino-soviética, os Estados Unidos aceitaram a política de "uma só China", que inclui Taiwan e que permitiu o ingresso do gigante asiático na Organização das Nações Unidas (ONU). Mas, ao mesmo tempo, os americanos rejeitam a reunificação política da China, a não ser por meios pacíficos, e continuaram vendendo armas para Taiwan.
Biden tem respondido com um titubeante "sim" às perguntas dos jornalistas se os EUA defenderiam a ilha diante de uma invasão chinesa. Mas não há tanta certeza. Agir, certamente faria movimentar a rede de alianças de ambos os lados - Coreia do Sul, Japão e Austrália para o lado americano, Coreia do Norte e Rússia para o chinês - que sugaria boa parte do mundo - e da economia - para a tempestade. Não agir, reforçaria a sensação de enfraquecimento da liderança global americana diante da potência desafiante do sistema. Inverter essa lógica é cavalo de batalha de Biden, mas até agora os resultados não são animadores.
Nas últimas semanas, a China tem realizado manobras militares muito próximas do território taiwanês, que considera como seu, obrigando as forças armadas de Taiwan a permanente estado de alerta.
A cúpula de segunda-feira (15) é a maior oportunidade para retomar a relação bilateral, chamuscada também pelos anos Donald Trump. Mesmo que temas sensíveis como Taiwan, Xinjiang e Hong Kong, fiquem à margem, é melhor que Biden e Xi conversem do que se mantenham distantes. Iniciativas como flexibilização de restrições de vistos, criação de canais sobre armas nucleares e uma possível estrutura para aliviar atritos comerciais podem pavimentar, indiretamente, o caminho para as questões mais urgentes - e potencialmente mais explosivas.