Um terremoto político. Assim muitos analistas estão considerando a derrota sofrida pelo governo de Alberto Fernández e Cristina Kirchner nas prévias realizadas no domingo (12) na Argentina. Conhecidas como PASO (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), o processo é uma espécie de termômetro para as eleições legislativas de meio de mandato, que irão se realizar em 14 de novembro.
A coalizão de governo Frente de Todos (centro-esquerda) perdeu na maioria das províncias, inclusive em Buenos Aires (cidades do entorno da capital federal), principal colégio eleitoral do país, onde estão concentrados 38% dos eleitores. A centro-direita, representada pela coalizão Juntos por el Cambio e que tem o ex-presidente Mauricio Macri como principal líder, foi a grande vencedora no país. Na província de Buenos Aires, ganhou por 37,99% dos votos contra 33,64%. O entorno da capital é um reduto tradicional da esquerda. Por isso, a derrota é também simbólica.
Na capital federal, a direita é mais forte. E, ali, Fernández sofreu ainda mais (a centro direita ganhou por 48,19% contra 24,66%).
As PASO tiveram um aspecto de plebiscito para Fernández, uma vez que foi o primeiro processo eleitoral durante seu mandato e ocorreu em meio à pandemia de coronavírus.
O revés para a Casa Rosada deve ter profundo impacto nos próximos meses na gestão do líder de centro-esquerda. Muitos analistas preveem mudança no ministério, e há sinais de distanciamento entre a ex-presidente e atual vice Cristina Kirchner. A facção política dela culpou Fernández pela derrota, o que indica um possível racha no governo.
Há o entendimento de que mudanças são necessárias para recuperar a popularidade perdida e não permitir que a derrota seja o primeiro sinal de um revés ainda maior, a perda definitiva da Casa Rosada nas próximas eleições presidenciais. O pleito já sinaliza um duro caminho até o pleito de novembro, quando serão renovados metade da Câmara dos Deputados (127 das 257 cadeiras) e um terço do Senado (24 dos 72 assentos).
Em 2019, o mau resultado nas PASO foi o início do fim dos planos de Macri de permanecer no comando da nação.
Fernández, como tem ocorrido em diferentes processos eleitorais na América Latina desde o início da crise sanitária, foi punido pela maneira como conduziu a reação à pandemia - o país chegou a viver a mais longa quarentena do mundo. Hoje, segundo pesquisa da Synopsis Consultoria, sua imagem é vista como negativa por 72,5% dos entrevistados.
Além da crise econômica, que fez piorar os índices de pobreza em um país que não consegue se desvencilhar das sucessivas instabilidades, há uma crise moral. Fernández é investigado devido a uma festa que organizou na residência oficial de Olivos no momento em que a Argentina vivia o lockdown. Em imagens que vazaram para a imprensa, o presidente aparecia sem máscara no evento com muitas pessoas.
Morreram de covid-19 no país 113 mil argentinos. Houve 5,5 milhões de casos. No ranking da vacinação, a nação contabiliza 39,88% da população completamente imunizada e 62,95% com ao menos uma dose, segundo o monitor da Universidade de Oxford.
Atualmente, o governo tem minoria na Câmara, e precisaria conquistar pelo menos 10 cadeiras em novembro para chegar à maioria - algo praticamente impossível a partir dos resultados de domingo (12). No Senado, a Casa Rosada tem maioria, mas precisa se recuperar desse baque para mantê-la.