Se há um único assunto com o qual democratas e republicanos concordam no polarizado cenário político dos Estados Unidos é sobre o inimigo comum: a China.
Claro que Joe Biden não lança mão de arroubos como os de Donald Trump com relação ao gigante asiático - nada de acusar os chineses de terem fabricado o coronavírus (ou "vírus chinês", como dizia) ou de dizer que imigrantes estariam roubando os empregos dos americanos.
O presidente democrata age mais nos bastidores. Longe dos holofotes, é mais estratégico. Mas a pressão é a mesma - ou maior - para tentar barrar o avanço chinês no que os EUA consideram sua área de influência, a América Latina, como parte de uma disputa maior por hegemonia no planeta, o grande duelo do século 21.
Apesar das divergências ideológicas com o governo de Jair Bolsonaro, a abordagem da Casa Branca de Biden tem sido pragmática, comportamento que desagrada a ala à esquerda do Partido Democrata (e muito da esquerda brasileira), que esperava críticas abertas e frequentes ao Planalto.
Não, Biden não fará isso. Primeiro porque eventuais críticas a Bolsonaro podem ser rapidamente rebatidas pelo argumento de tentativa de ingerência em assuntos internos do Brasil, o que não é bem visto inclusive pela comunidade internacional. Segundo porque, em um cenário tenso pré-eleitoral no qual o Brasil está metido, com ameaças ao sistema por parte de Bolsonaro, qualquer opinião da Casa Branca traria de volta fantasmas da Guerra Fria.
Não é necessário morrer de amores pelo atual presidente brasileiro, mas também, na cabeça dos estrategistas americanos, não se pode deixar o Brasil cair no colo do dragão chinês. A lógica é conhecida: o inimigo do meu inimigo é meu amigo.
E, se não é possível prever o cenário pós-eleição brasileira em 2022, é necessário, ao menos, correr para garantir o que está ao alcance da política externa dos EUA neste momento.
Banir a Huawei do Hemisfério Ocidental é ponto fulcral da estratégia americana, seja democrata ou republicana. É por isso que Biden despachou para o Brasil o diretor da CIA (agência de inteligência americana), William Burns, em julho. E é por isso que a maior delegação de altos funcionários da Casa Branca democrata em anos está em Brasília nesta quinta-feira (5) e irá, na sexta (6), a Buenos Aires.
Vieram o conselheiro de Segurança Nacional, Jake Sullivan, e os diretores do Conselho de Segurança Nacional para o Hemisfério Ocidental, Juan Gonzalez, para Tecnologia e Segurança Nacional, Tarun Chhabra, para Estratégia de Cibersegurança, Amit Mital, além do alto funcionário do Departamento de Estado Ricardo Zúñiga..
Com exceção do posto de Zúñiga, os cargos dos demais funcionários de Biden denotam a associação entre segurança e tecnologia: leia-se o perigo, na visão dos EUA, de a Huawei participar (e eventualmente) vencer o leilão da rede 5G.
Para os americanos, a empresa se utiliza da infraestrutura nos países para roubar dados para o Partido Comunista Chinês, algo que Pequim e a companhia negam de forma veemente.
Por enquanto, a Huawei ainda está no leilão da 5G, que deve ocorrer este ano. Mas, nos próximos dias, pode haver novidades. O ministro das Comunicações, Fábio Faria, já indicou que o governo pretende criar uma rede paralela para atividades do Executivo - ou seja, se a Huawei vencer o leilão, ela cuidaria apenas da rede comercial. Dados de governo (e provavelmente militares) seriam trocados por outro sistema. Mas, depois da visita desta quinta-feira (5), tudo pode mudar.