Uma nova nuvem de suspeitas paira sobre o Facebook.
Na mira de autoridades nos Estados Unidos, na Europa e na Oceania por medidas insuficientes contra a disseminação de notícias falsas e os discursos de ódio na rede social, além de concorrência desleal e uso de conteúdos jornalísticos sem pagar pelos mesmos, a empresa de Mark Zuckerberg, agora, tenta intimidar pesquisadores da New York University que investigam o impacto de anúncios políticos na rede durante as eleições americanas.
Em carta enviada em 16 de outubro aos estudiosos, Allison Hendrix, executiva da companhia do Vale do Silício, exigiu que um plug-in chamado "ad Observer" seja desinstalado dos navegadores Chrome e Firefox dos 6,5 mil voluntários que participam do trabalho. A ferramenta permite que os persquisadores vejam quais anúncios políticos no Facebook são exibidos para cada voluntário.
"Ferramentas de extração de dados, não importa o quão bem-intencionadas sejam, não são meios permitidos para coletar informações de nós", diz a carta.
Na carta, a executiva ainda ameaça os pesquisadores com "ação coercitiva adicional" (leia-se, processo judicial), caso o plug-in não seja desinstalado dos equipamentos até 30 de novembro.
A ironia do episódio é que o Facebook não permite que empresas coletem e analisem dados de sua rede, mas faz isso o tempo todo com as informações dos usuários para vender anúncios e ganhar muito dinheiro.
Os voluntários da pesquisa concordaram, por escrito, em participar do estudo, dando acesso às propagandas políticas que chegam a seus perfis. Os pesquisadores conseguiram, por meio desse levantamento, até agora identificar públicos bem definidos que estão na mira dos estrategistas durante a disputa a campanha presidencial - por meio de microtargeting, como raça, idade, sexo e preferência política. Revelaram, por exemplo, que a campanha do presidente Donald Trump buscava influenciar mulheres da Flórida e Michigan, por meio de anúncios que associavam o rival democrata, Joe Biden, a protestos de violentos de movimentos antifascistas. Os pesquisadores também descobriram que o Facebook desrespeita regras que a empresa criou alegadamente para dar mais transparência a seus anúncios. A decisão era sempre informar quem pagou pelos anúncios políticos, mas, segundo a pesquisa da New York University, cerca de 10% dos anúncios não têm essa informação.
Agora, jornalistas, advogados especializados na Primeira Emenda da Constituição americana, que garante liberdade de imprensa e expressão, e acadêmicos de outras universidades dos Estados Unidos se uniram em apoio à pesquisa da New York University e contra o Facebook.
- É alarmante que o Facebook esteja tentando fechar uma ferramenta crucial para expor a desinformação na corrida para uma das eleições mais importantes da história dos EUA - disse Ramya Krishnan, advogada do Knight First Amendment Institute da Columbia University, que representa os pesquisadores. - O público tem o direito de saber quais anúncios políticos estão sendo veiculados e como estão sendo direcionados. O Facebook não deveria ser o guardião das informações necessárias para salvaguardar nossa democracia - acrescentou ela à CBS News.
Há quatro anos, na disputa presidencial entre Trump e Hillary Clinton, o Facebook também teve participação suspeita. Cerca de 50 milhões de usuários tiveram suas informações vazadas para a empresa de marketing político Cambridge Analytica por meio de testes de personalidade na rede social. A consultoria britânica usou dados disponíveis no Facebook para traçar perfis psicológicos detalhados de eleitores dos EUA, na campanha pró-Trump.
No ano passado, mais de 200 pesquisadores assinaram uma carta ao facebook solicitando que levantasse as restrições à pesquisa de interesse público e ao jornalismo e que permitam a coleta digital automatizada de dados da plataforma.