O orçamento da União para 2025, aprovado na quinta-feira no Congresso, com três meses de atraso, é uma síntese da composição de forças que reina em Brasília e um triste retrato de um país em que as conveniências políticas se sobrepõem aos interesses dos brasileiros. Do impasse que postergou a votação até o conteúdo em si, a peça expressa a dominância do centrão diante de um Executivo desarticulado e sem capacidade para equilibrar o jogo no Legislativo, além da desfaçatez de um cálculo eivado de irrealismos que prevê um superávit de R$ 15 bilhões.
Indiferente às verdadeiras prioridades, o Congresso não abriu mão de pulverizar R$ 50,4 bi em emendas
A sequência de caradurismos começa com a própria procrastinação do parlamento em votar o orçamento como retaliação à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de bloquear, no ano passado, o pagamento de emendas que não obedeciam a regras mínimas de transparência e de zelo com o dinheiro público. Por enxergarem o dedo do governo na postura da Corte, deputados e senadores acharam por bem sabotar o próprio país para defender a regalia imoral da distribuição exorbitante de recursos às bases eleitorais, com o mínimo controle.
Indiferente às verdadeiras prioridades nacionais, o Congresso não abriu mão de pulverizar R$ 50,4 bilhões em emendas. Enquanto isso, faltam recursos para iniciativas estruturantes, como as de infraestrutura, essenciais para competitividade da economia brasileira. É dinheiro que acaba drenado para obras paroquiais e projetos inconsistentes, muitas vezes pessimamente executados. Isso quando não viram assunto de polícia. Os cerca de 80 inquéritos abertos para investigar malfeitos com o dinheiro alocado por congressistas que tramitam no STF são bastante ilustrativos.
Mas o Congresso, insaciável, não se contentou com os já excessivos R$ 50,4 bilhões. Um acordo costurado com o Planalto, refém do parlamento, vai permitir que deputados e senadores apadrinhem a destinação de verbas que seriam despesas discricionárias do Executivo. O espírito do trato é compensar os valores que acabaram retidos em 2024 pelas decisões do STF. As estimativas variam entre R$ 8 bilhões e R$ 11 bilhões. Mas, ao fim, a farra das emendas pode chegar neste ano a cerca de R$ 60 bilhões.
O poder desse bloco de siglas que, sem linha programática firme, aderem a qualquer governo, desde que bem recompensadas, se materializa também no direcionamento das verbas para os ministérios. Das quatro pastas que mais foram vitaminadas com recursos em relação ao exercício anterior, três – Esportes (270% de crescimento), Turismo (180%) e Integração e Desenvolvimento Regional (79%) – são comandadas por membros do centrão. À gestão Luiz Inácio Lula da Silva, com a popularidade em queda livre, resta aceitar as chantagens para assegurar vitórias em votações essenciais ao Executivo e, com mais verbas, tentar garantir o aluguel de ao menos parte das siglas fisiológicas na campanha eleitoral de 2026.
A cereja do bolo indigesto é a tentativa de disfarçar a desídia com os recursos recolhidos junto aos contribuintes com um cálculo ilusório. O relator do orçamento produziu uma estimativa de superávit de R$ 15 bilhões, projetado a partir de receitas que dificilmente se confirmarão e de despesas subdimensionadas. Um deboche do início ao fim.