O comportamento intempestivo do presidente dos EUA, Donald Trump, que a todo momento anuncia medidas para em seguida recuar e postergar decisões, em especial em sua guerra tarifária, mostra que a única certeza em relação à postura do republicano é a de que não é possível ter certeza sobre qual posição prevalecerá. A sobretaxa de 25% sobre as importações de aço e alumínio imposta a todos os países que vendem para os Estados Unidos, anunciada ainda em fevereiro, de fato, começou a vigorar ontem. União Europeia e Canadá anunciaram imediatamente retaliações. O bloco europeu promete revidar com tarifas adicionais sobre o equivalente a R$ 164,9 bilhões em bens norte-americanos. No caso canadense, seriam R$ 120,3 bilhões.
O mal-estar em relação à guerra comercial de Trump passa a ser mais evidente inclusive nos Estados Unidos
O Brasil, um dos principais atingidos, notadamente nas vendas de aço, manifestou ontem a intenção de apostar nas negociações bilaterais. É a postura mais prudente, diante dos prováveis efeitos negativos de uma reciprocidade, que talvez servisse apenas para dar uma satisfação à opinião pública. As idas e vindas de Trump, além da possibilidade de o Brasil demonstrar que a medida, no caso brasileiro, é prejudicial também para a indústria siderúrgica norte-americana, dão margem para insistir no diálogo.
O Brasil foi o segundo maior fornecedor de aço para os EUA no ano passado, com o embarque de 3,88 milhões de toneladas, 16% do total da matéria-prima importada. O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, teve na semana passada uma videoconferência com o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick, e com o representante de Comércio, Jamieson Greer. As partes concordaram em prosseguir com reuniões bilaterais sobre o tema.
A confiança brasileira é sustentada por argumentos razoáveis. Em primeiro lugar, os EUA são superavitários nas trocas comerciais com o Brasil. O déficit norte-americano com o mundo, motivo de queixas de Trump, nada tem a ver com o país, portanto. Daqui também saem essencialmente produtos semiacabados de aço, que são beneficiados por indústrias norte-americanas para serem revendidos. A interrupção brusca desse fluxo prejudicará parte do próprio setor nos Estados Unidos. Ademais, o governo e o segmento siderúrgico brasileiro asseguram que conseguem demonstrar ser infundada a alegação da Casa Branca de que existiria uma triangulação e o aço que chegaria ao mercado norte-americano seria chinês. Se prevalecer a racionalidade, portanto, há um caminho para negociar uma solução, assim como ocorreu no primeiro governo Trump. A dúvida é se a razão, demonstrada por fatos, números e argumentos, desta vez será suficiente.
O mal-estar em relação à guerra comercial de Trump, porém, passa a ser mais evidente inclusive nos Estados Unidos. Além dos alertas de que as sobretaxas terão efeito inflacionário, cresce o temor de que as atitudes do presidente norte-americano causem uma recessão interna, algo que nem o próprio Trump descarta. A conferir se o republicano vai mesmo arriscar ser responsabilizado por uma crise econômica só para manter a pose de durão.