A guerra comercial iniciada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, requer atenção e cautela do Brasil. No sábado, o republicano anunciou a imposição de tarifas de importação de 25% para o Canadá e o México, de 10% para a China e ameaçou a União Europeia de ser a próxima da fila. Nesta segunda-feira, no entanto, firmou acordos com os governos mexicano e canadense que postergam por um mês o início das sobretaxas a partir do compromisso dos vizinhos de reforçar a vigilância nas fronteiras para combater o tráfico do opioide fentanil.
Ao governo Lula cabe ter a devida prudência, sem resvalar para provocações ou elucubrar em voz alta
O Brasil já foi citado por Trump como possível alvo de tarifaços semelhantes. Ao governo Luiz Inácio Lula da Silva cabe ter a devida prudência, sem resvalar para provocações ou elucubrar em voz alta sobre hipóteses diante de algo que não se sabe com certeza se ocorrerá e se seria amplo ou sobre produtos específicos, como ocorreu durante o primeiro mandato de Trump, que atingiu o aço e o alumínio brasileiros. Foi afoita a fala de Lula na quinta-feira, assegurando que haveria reciprocidade, sobretaxando a entrada de produtos dos EUA. Uma reação adequada depende de uma análise a sangue-frio de eventual medida. A Lei de Talião pode ocasionar problemas maiores para a própria economia brasileira. Não se trata de covardia, mas de estratégia diante do que pode ser apenas uma bravata ou uma tática para extrair vantagem em negociações.
Outros aspectos da guerra tarifária de Trump devem ser considerados. As tensões com Pequim, no mandato anterior do republicano, forçaram a China a adquirir mais produtos agropecuários do Brasil, principalmente soja. Por enquanto, os chineses dizem que vão recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC), órgão que na prática está paralisado, em mais um sinal da crise do multilateralismo, e tem chances ínfimas de solucionar um contencioso como este. Em 2019, o gigante asiático, em represália, acabou sobretaxando a soja norte-americana.
O impulso protecionista dos EUA, em contraposição do histórico do país na defesa do livre-comércio, tem ainda o potencial de levar outros países e blocos a firmarem acordos que sejam um contraponto à política atual da Casa Branca. Ameaçada, a União Europeia tem mais razões para acelerar o tratado com o Mercosul. A conclusão das negociações foi anunciada em dezembro, em Montevidéu, após 25 anos de tratativas, avanços e impasses, mas ainda há países europeus que se opõem.
Por fim, o Brasil deve ficar atento aos reflexos indiretos tanto da guerra comercial de Trump quanto da política de caça a imigrantes ilegais. Os tarifaços, se levados adiante, tendem a tornar produtos mais caros nos EUA e interromper cadeias de suprimentos. As deportações em massa devem restringir a oferta de mão de obra. Nos dois casos, o efeito é inflacionário, elevando as incertezas sobre o ciclo monetário norte-americano. Na última quarta-feira, o Federal Reserve (Fed), após três cortes consecutivos, interrompeu o afrouxamento dos juros, à espera de uma melhor avaliação das consequências das medidas de Trump. Para o Brasil, isso significa pressão no câmbio e que o período de Selic alta pode perdurar, ampliando os efeitos contracionistas na economia. São motivos que reforçam a importância da responsabilidade fiscal.