Ainda que o número de feminicídios tenha caído nos últimos dois anos no Estado, o assassinato de mulheres por questão de gênero segue como um dos principais desafios na área de segurança no Rio Grande do Sul. A dificuldade para combater esse crime covarde reside na complexidade dos fatores que o cercam, como o fato de a maior parte dos homicidas ser companheiros ou ex-companheiros das vítimas, pelo ciclo de violência doméstica que o antecede, pela consumação em regra ocorrer dentro das residências, pelo fator emocional envolvido e devido à cultura do machismo.
É preciso insistir na educação para ensinar e conscientizar que os homens não têm poder sobre o destino das mulheres
A prevenção, em múltiplas frentes, é a melhor estratégia. É um processo que necessita, em primeiro lugar, da coragem das mulheres para denunciar seus opressores. Para isso, devem se sentir seguras para comunicar às autoridades os maus-tratos e as ameaças que sofrem. A parti daí, entra o trabalho da polícia e do Judiciário, com a concessão de medidas protetivas, como a que proíbe que o agressor se aproxime da vítima.
Feminicídios são mortes evitáveis e evidências demonstram que as restrições impostas aos homens violentos são eficazes. Em novembro do ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha têm validade indeterminada. Em seu voto, o ministro Rogério Schietti citou uma pesquisa do Ministério Público de São Paulo demonstrando que em 97% dos casos de violência contra a mulher com posterior concessão de medidas para salvaguardá-las evitou-se o desfecho fatal.
Exceções existem, é claro, como mostrou o chocante caso de segunda-feira em São Francisco de Assis, em que um homem perseguiu e matou a tiros a ex-companheira, apesar de ela ter uma medida protetiva desde a semana anterior. Foi o 10º feminicídio de janeiro no RS. Mas as estatísticas do Estado confirmam a importância do anteparo judicial para o homem denunciado manter distância da vítima. No ano passado, 87% das mulheres mortas não tinham medida protetiva, conforme a Polícia Civil.
Mas ainda é preciso aperfeiçoar as formas de resguardar as vítimas de violência doméstica. Desde 2023 o Rio Grande do Sul adota uma nova estratégia, por meio do uso de tornozeleiras eletrônicas em agressores. A colocação, no entanto, depende de decisão judicial, de acordo com as circunstâncias do caso. Com um celular, a vítima é notificada em caso da aproximação. A Brigada Militar também recebe a informação.
Mas a extensão do uso da tecnologia, até aqui, parece aquém do ideal. Em junho de 2023, quando o primeiro equipamento foi afixado em um agressor, o governo gaúcho previa o uso de 1,8 mil tornozeleiras. Em entrevista ontem ao Gaúcha Atualidade, na Rádio Gaúcha, o chefe da Polícia Civil, Fernando Sodré, informou que apenas 175 são hoje utilizadas e existem ainda cerca de 2 mil disponíveis. Cabe uma avaliação mais minuciosa, das autoridades policiais e judiciais, para ampliar o monitoramento eletrônico.
O aspecto cultural é outro a exigir atenção. Mesmo que resultados possam aparecer no longo prazo, com a instrução das gerações mais novas, é preciso insistir na educação para ensinar e conscientizar que os homens não têm poder sobre o destino das mulheres e não são donos de suas vidas ou corpos.