Assim como a garotada voltou a se reunir alegre e aflitivamente para trocar figurinhas da Copa, um fenômeno analógico em tempos digitais, deveríamos também promover encontros coletivos de cidadãos para debater, selecionar e, talvez, até jogar bafo com os candidatos às próximas eleições. Tite ainda não escalou o seu time para jogar na Rússia, nem o fizeram os treinadores das demais seleções, mas os cartolas da Fifa e os editores do álbum já lançaram os seus pré-candidatos – e estão faturando os tubos com a onda autocolante.
Colecionismo custa caro, mas é bem divertido. Política custa ainda mais – e não costuma ser nada divertida para quem elege governantes ineptos e desonestos. Porém, vai ter Copa, sim! E vai ter eleições também. Gostemos ou não, temos que nos ligar nos dois assuntos se quisermos participar de alguma forma do futuro imediato da nação.
Em relação ao futebol, registra-se uma irônica curiosidade: o Brasil é o campeão mundial de consumo de figurinhas da Copa da Rússia, seguido sabem de quem? Pois é, da Alemanha. Nossos meninos e meninas – além de pais, mães, avós, tios e adultos sem qualquer laço de parentesco com eles – estão envolvidos numa mobilização frenética de escambo, visível nas esquinas da cidade, nos shoppings, nas escolas, em lugares e circunstâncias improváveis. Nesse mercado de paixões esportivas, um Neymar, um Messi ou uma imagem brilhante alcançam altas cotações.
Na política, ocorre o contrário. Os eleitores continuam desencantados com os seus representantes e desconfiados em relação a qualquer pretendente a cargo público. Ainda assim, já temos mais de 20 pré-candidatos à Presidência da República – 15 deles, segundo recente investigação jornalística, respondendo a acusações judiciais que vão da corrupção à infração de trânsito. O retrospecto dos últimos ocupantes do principal posto da nação também não ajuda: dos cinco ex-presidentes vivos, um está preso, dois foram impichados e os outros dois também estão citados na delação da Odebrecht como beneficiários de recursos da propina.
Nesse contexto, nosso grande desafio para preencher o álbum obrigatório da política nacional será encontrar figurinhas raras que possam nos representar dignamente durante seus mandatos. Sei que é difícil, mas temos que acreditar que elas existem, ou que talvez estejam sendo moldadas no rastro da revolução ética representada pela Lava-Jato.
Dizem os psicanalistas que o colecionismo oferece aos indivíduos a oportunidade de controlar o pequeno mundo de sua coleção, já que ele não consegue controlar a realidade. O voto pode ser uma ilusão semelhante, mas é a chance que todos temos de escolher livremente pessoas decentes para governar em nosso nome.
Que tal começar uma coleção de craques da virtude? Não estou sugerindo moralistas nem salvadores da pátria. Com esses também devemos ter os devidos cuidados. O que nos compete como cidadãos e eleitores, neste momento preocupante da vida nacional, é buscar informações confiáveis sobre os personagens da política.
Se deixarmos para decidir no jogo do bafo, correremos o risco de ter que engolir figurinhas repetidas e indesejadas.