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O jornalista Anderson Aires colabora com a colunista Marta Sfredo, titular deste espaço.
A rede gaúcha ICH Administração de Hotéis, que tem 43 empreendimentos no país, deve finalizar um projeto "emblemático" em Porto Alegre neste ano, dentro do Country Club. A expansão para os próximos anos, no entanto, não tem o Rio Grande do Sul em sua base, diz o CEO e fundador da ICH, Alexandre Gehlen. Depois de "um dos melhores anos da história", a empresa prevê crescer no Brasil, porque não há motivos para "sair enquanto temos um campo enorme de mercado".
O que o Rio Grande do Sul, Estado de origem da ICH, representa para operação atual da empresa?
Nascemos em 1999. Os primeiros investimentos foram todos no RS. Na época, o RS estava crescendo muito, com a implantação da GM (General Motors), da Ford. Naquele contexto, era o Estado que estava recebendo toda a atenção. Ao longo dos anos, crescemos com outro modelo de negócio, o que nos fez uma empresa nacional. Dos nossos 7 mil quartos, 23% estão no RS.
Então, houve menor impacto da enchente?
A enchente acarretou em um faturamento 6% menor em maio. Dá uma alívio sabermos que estamos espalhados pelo Brasil todo. Em termos de receita total, a empresa faturou cerca de R$ 700 milhões em 2024. Só os hotéis de Porto Alegre tiveram impacto físico da enchente. Aproveitamos para revitalizar as unidades que foram atingidas. Outras cidades, como São Leopoldo, Canoas e Gravataí, até tiveram um aumento de ocupação em função das pessoas que estavam se hospedando a trabalho ou para visitar parentes.
Como a empresa avalia 2024?
O nosso ciclo está muito vinculado a características macroeconômicas, microeconômicas e até de alguma superoferta. Nesse contexto, o melhor ano da hotelaria brasileira foi 2012. Depois, tivemos anos de queda. Batemos o pior momento em 2017. Quase teve retorno em 2019. Em 2020 e 2021, veio a pandemia, e sobrevivemos. Apostávamos que o novo normal seria viajar, e em 2022, as pessoas realmente voltaram a viajar com mais frequência. O ano de 2023 foi espetacular, e 2024, ainda acima. Ouso dizer que 2024 foi um dos melhores anos da história da rede ICH em termos de ocupação, resultados.
Por quê?
Fomos beneficiados pelo Perse, que é um programa do governo que isenta empresas da nossa indústria de alguns tributos. Fez com que pudéssemos devolver esse tributo para caixa, para investidores, usar para reforma. Também tivemos uma indústria de shows, eventos e entretenimento muito pujante em 2024. Neste ano, o tributo volta, e estamos projetando um 2025 de mais estabilidade, com crescimento perto de 9%.
O que explica a projeção?
Tem uma inflação importante que não dá para desconsiderar. Mas, se nós olharmos o pós-pandemia, a primeira resposta seria: o brasileiro aprendeu que é legal viajar pelo Brasil. Temos um câmbio que desfavorece viagem internacional e um país que merece se destacar para um público interno. E não temos uma superoferta hoteleira no horizonte de curto e médio prazos. Olho o nosso orçamento de 2025 como um otimista cauteloso, um realista. O nosso setor está intimamente ligado à macroeconomia. As passagens aéreas seguem sendo um gargalo importante.
O câmbio fez os argentinos "invadirem" o litoral gaúcho no início deste ano, mas também deve aumentar custos de hotelaria, passagens aéreas. É um indicador com percepções distintas, mesmo?
Quando o dólar era R$ 2, tínhamos muitos brasileiros viajando para fora e poucos estrangeiros vindo para o Brasil. Há 30 anos, o país recebe 6 milhões de turistas estrangeiros por ano. Quando temos uma ruptura e o dólar vai a R$ 6, tem impactos no nosso setor, como a chegada dos vizinhos argentinos e uruguaios em viagens de até 5 horas. Tivemos uma ocupação muito importante no RS, em SC e até no RJ, mas é momentâneo. Depois das férias, volta à normalidade. A longo prazo, com um câmbio nesse patamar, a tendência é que a gente receba mais estrangeiros em cidades turísticas, como é o caso de Rio de Janeiro, Recife, Salvador.
Teve impacto no resultado?
Tivemos um incremento importante. Em Florianópolis, por exemplo, cerca de 30% dos clientes foram chilenos, porque simplesmente tem uma rota aérea ligando Santiago e Florianópolis. Um terço chileno, um terço argentino e um terço brasileiro: esse foi o número do impacto nos meses de janeiro e fevereiro.
E no Rio Grande do Sul?
Aqui, tenho a impressão de que foi entre 10% e 20%, no máximo, principalmente de argentinos e uruguaios. Não foi tão expressivo quanto Florianópolis. Todo o litoral gaúcho e catarinense tem muito mais importância para esse turista do que Porto Alegre. Com a Orla, com todo o investimento que está sendo feito no setor de lazer, vamos precisar divulgar melhor a cidade para esse público.
Como está o projeto de expansão da ICH?
Nascemos em 1999 construindo os nossos hotéis próprios. Em 2004, migramos para prestação de serviços. Emprestamos o nome, o know-how (fórmula de negócio) e tecnologia para investidores. Esse modelo depende muito do anseio de fazer novos negócios, do potencial de colocar uma marca. Próxima abertura é em Chapecó (SC), um hotel Tru by Hilton. Temos um acordo com a rede Hilton e trouxemos para o Brasil a marca Tru by Hilton, de hotéis econômicos. Temos obras em Marechal Cândido Rondon (PR), Teresina (PI). Também temos uma unidade Tru by Hilton importante na região de Tatuapé, o nono endereço em São Paulo, e um Intercity, de hotelaria urbana média, em Cascavel (PR). Mas um dos projetos mais emblemáticos será o do hotel que estamos iniciando a construção agora, no Terminal 3 do Aeroporto Internacional de Guarulhos.
Qual será a bandeira?
Vai ser uma marca internacional que está sendo negociada ainda, e a operação é da ICH. Ainda tem o hotel em Porto Alegre, com a CFL, que vai trazer um outro patamar de hotelaria para capital gaúcha. Será um hotel dentro do Country Club, com 84 apartamentos, todos voltados para o campo. Já neste final de ano, início do ano que vem, o hotel vai começar a abrir as portas para o mercado gaúcho. Vamos ter dois papéis, de operador e de investidor. A CFL é incorporadora e sócia do empreendimento. Ainda estamos tratando a marca, mas garanto que é um hotelaria padrão superior. Nas próximas semanas, devemos ter algo para comentar.
Além de Porto Alegre, há outro projeto em andamento no Rio Grande do Sul?
Temos operação em Canoas, São Leopoldo, Porto Alegre, Gravataí, Caxias do Sul e Gramado. Os novos hotéis estão fora do Estado. Mas, depois da enchente, renovamos o ativo do Intercity do aeroporto Salgado Filho. Estamos fazendo o mesma padrão de reforma em Florianópolis e, assim que concluir lá, vamos vir para Caxias do Sul.
Por que os planos de expansão são fora do Estado?
Não existe uma resposta única. O que existe são as oportunidades que surgem e as e as ofertas que nos surgem através dos investidores. São mais de 3,8 mil investidores que nos chamam a todo momento para ver estudos vocacionais, e esses investidores muitas vezes não estão no RS. Atendemos uma demanda existente. Criar demanda já é um pouco mais difícil. Tem cidades gaúchas que merecem uma atenção , especialmente as secundárias, como Passo Fundos, Santa Maria, Santa Cruz do Sul. Neste momento, a ICH está com oportunidades fora, mas estamos superabertos.
O que faria o Rio Grande do Sul ser mais atrativo?
Temos de aprender com exemplos. O crescimento vem da origem, das pessoas que vivem naquele local. Talvez a cidade que mais se destacou nos últimos 20, 30 anos em termos de saber fazer turismo é a Gramado. Na cola, vem uma nova cidade que está buscando o seu espaço no mercado nacional, que é Bento Gonçalves. O nosso litoral poderia ter esse viés. E Porto Alegre é o centro disso tudo, onde as pessoas chegam e saem. Cabe a nós, porto-alegrenses, saber fazer com que os turista fiquem aqui um pedaço do tempo deles.
A ICH tinha uma operação em Montevidéu. Há novos planos para o Exterior?
Montevidéu foi uma experiência enriquecedora. Com a superoferta, os investidores locais entenderam que era o momento de migrar para outro tipo de negócio, e nós ficamos na gaveta. Focamos no mercado brasileiro, mas não significa que não possamos mirar Uruguai, Argentina, Chile, Paraguai. Não temos nada no horizonte hoje. Sair do Brasil enquanto temos um campo enorme de mercado seria dividir forças.
Qual o impacto do Carnaval para a ICH?
O carnaval é importante para aquelas cidades onde o município aposta nas festividades. Nesse contexto, o Carnaval, para nós, majoritariamente, é um período de baixa.
*Colaborou João Pedro Cecchini