Entre segunda e terça-feira, houve uma desconfortável DR no Palácio do Planalto. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou o ministério para evitar erros de comunicação, depois que a manipulação de parte da oposição transformou uma burocrática portaria da Receita Federal em manobra para "taxar o Pix". Ponto para a oposição e a economia subterrânea, que provocaram recuo do governo, mas aí não havia "erro", apenas ineficiência.
O "erro", mesmo, veio no dia seguinte à tentativa de correção de rota. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, achou que ajudaria a dar popularidade ao governo se dissesse, em programa oficial, que estava em estudo um "conjunto de intervenções" para baixar a inflação. Para "contribuir", o ministério da Agricultura informou que uma das medidas seria a alteração de regras sobre validade de alimentos.
Não fosse o alívio proporcionado pela falta de anúncios do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre aumento de tarifas, o efeito poderia ter sido muito pior. Mas a semana de tiro no pé termina com nova reunião no Planalto, nesta sexta-feira (24), sobre medidas capazes de baixar o preço dos alimentos.
Se há um sinal positivo é o de reconhecer que a inflação está alta e que muitas famílias enfrentam preços que subiram muito acima da média – cada padrão de consumo tem a sua variação específica, é bom lembrar. Sem contar variações muito fora da curva de itens muito específicos, como o abacate, que saltou 174,67% em 2024, as maiores pressões em alimentos vieram de café, óleo de soja e carnes.
O café subiu porque repetidas secas e inundações prejudicaram a oferta global, fazendo o preço subir em todo o planeta. O que o governo Lula pode fazer, além de preservar a Amazônia? Nada. No caso das carnes, a situação é mais complexa, porque envolve ao menos quatro fatores. Além do clima, há mudança no ciclo de abates, que cresceram muito nos anos anteriores, com redução do rebanho, o aumento de exportações e do consumo.
O óleo de soja é mais didático: um dos motivos do aumento é a alta do dólar, já que o grão tem cotação internacional. Nesse caso, a medida mais eficaz seria equilibrar as contas públicas, pois foi a crise de confiança fiscal que ajudou a levar o câmbio para R$ 6 e além. Mas isso está em discussão no Planalto? Aparentemente, não.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tenta dar racionalidade. Na quinta-feira (23), disse que a mudança no prazo de validade de alimentos, sugerida pela Associação Brasileira dos Supermercados (Abras), não vai prosperar:
— Toda proposta feita por um setor vai virar política pública? Se depender da Fazenda, não. Tem muitas que têm impacto, muitas que são contraproducentes e muitas que não vão funcionar bem.
Depois de Costa ao mencionar "intervenções" e do Ministério da Agricultura antecipar alternativas ainda não aprovadas – o que foi explicitamente vetado por Lula –, o governo insiste em cometer não um erro de comunicação, mas de gestão: cria expectativa de solução de problemas insolúveis. Eventuais medidas que possa anunciar terão efeito pequeno ou nenhum, e pode contratar novo desgaste, desta vez não restrito ao mercado, mas com consumidores (ou eleitores).