Havia grande expectativa sobre a ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), publicada nesta terça-feira (25). Um dos motivos foi especialmente misterioso comunicado da manutenção do juro emitido no dia 19, sem sinal sobre os próximos passos.
Foi um "momento esfinge" do Copom, em alusão ao personagem da mitologia que determinava a quem aparecesse pela frente "decifra-me ou te devoro".
Como o mercado anda pessimista, circulavam teses de que poderia significar que havia sido discutida da hipótese de aumento da taxa em futuro próximo. Nesta terça-feira (25), ao interpretar o "banco-centralês" do texto, gurus do mercado afastaram essa hipótese.
Segundo Caio Megale, economista-chefe da XP, a ata traz "indício" de que "o Copom não quer sinalizar altas de juro" pela frente. A novidade do documento é a "hipótese de taxa neutra". Calma que a coluna explica: uma das tarefas do comitê é estudar qual seria a taxa que faria a economia nem contrair nem expandir - daí o "neutra".
Como afirma a própria ata, trata-se de "variável não observável, sujeita a grande incerteza na estimação". Mesmo assim, o Copom elevou essa "hipótese" de 4,5% para 4,75%. É pouco? É. Mas é um sinal que o mercado entende.
Para Megale, "outra evidência na mesma direção" - sem alta da Selic no curto prazo - é o fato de a maioria dos nove integrantes decidiu manter o balanço de riscos simétrico "nessa reunião" (destaque do economista). Acrescenta que "daqui para frente, o balanço de riscos pode se tornar assimétrico".
Mas o que isso significa? Um balanço "simétrico" - equivalência entre fatores positivos e negativos de risco - não exige grande mudança na estratégia. Um "assimétrico" – neste momento, a única possibilidade seria ter mais negativos do que positivos - poderia determinar necessidade de aumento na taxa.
Como a publicação da ata também termina com o período de silêncio do Copom, nesta terça-feira (25) falaram sobre juro tanto o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo - virtual substituto de Roberto Campos Neto a partir de janeiro de 2025 - quanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ambos destacaram que o Copom fez uma interrupção no ciclo de baixa, não determinou seu fim.
— A ata está muito aderente ao comunicado, não tem nada muito diferente, o que é bom. Eventuais ajustes, se necessários, sempre vão acontecer, mas é importante frisar que a diretoria fala de interrupção no ciclo, e essa é uma diferença importante para ser salientada — disse Haddad.
— A palavra que a gente utilizou foi interrupção, mas claramente a gente não quer fazer qualquer tipo de sinalização para a frente, (...) pretende deixar aberto para gente ver como é que as coisas vão se desdobrar a partir de agora — disse Galípolo, cheio de cautela, em evento da gaúcha Warren Investimentos.
Ou seja, o mercado buscou atenuar, mas o Copom está, propositalmente, em fase esfinge. Na mitologia, esse ser era representado com corpo de leão e rosto humano. Seu símbolo mais conhecido é a esfinge de Gizé, com rosto do faraó Quéfren, filho de Quéops.
Os fatores de pressão no mercado
Falta de perspectiva do início de cortes de juro nos EUA: a taxa alta lá e mais baixa aqui diminui a atratividade de investimentos no mercado financeiro no Brasil, e investidores resgatam aplicações aqui para migrar para mercados mais lucrativos.
Ajuste fiscal: a decisão do governo Lula de reduzir o déficit primário (despesas maiores que receitas antes do pagamento da dívida) só com aumento de arrecadação, sem corte de gastos, é considerada frágil e difícil de manter ao longo dos quatro anos de mandato. A recente ajuda ao Rio Grande do Sul, que eleva os gastos, contribui com essa percepção. Sinalizações de cortes de gastos nos últimos dias chegaram a proporcionar algum alívio, mas não duradouro.
Conflitos e eleições pelo mundo: conflitos entre Rússia e Ucrânia e entre Israel e Hammas elevam incertezas, assim como as eleições para o Parlamento Europeu, que geraram antecipação de pleitos em vários países, inclusive na França, "sócio-fundador" da União Europeia, com risco potencial para a existência do bloco.