As polêmicas do filme O Mundo Depois de Nós vão muito além do final relativamente aberto e profundamente irônico. Uma das cenas mais impactantes da obra da Netflix une, na vida real, nada menos do que o bilionário que terminou 2023 como o mais rico do mundo, Elon Musk - que chegou a integrar um conselho no governo de Donald Trump, ao ex-presidente Barack Obama, que, com sua mulher, Michelle Obama, integra a produção
A alta voltagem da cena faz com que sua protagonista, a atriz Julia Roberts, vire quase uma coadjuvante diante das estrelas, os carros da Tesla, fabricante de carros elétricos que testa direção autônoma e pertence a Musk.
Na história, o personagem de Julia tenta uma saída do isolamento e depara com um incrível congestionamento formado apenas por Teslas brancos. Segundos de incompreensão são seguidos pela explicação, sempre sem palavras: novos carros sem motoristas, ou seja, com direção autônoma, chocam-se com o final da fila.
Musk, que comprou o Twitter para transformar em X, reagiu a uma publicação da Netflix em sua "própria casa" - quantas conexões e reflexões isso desperta, não é verdade? Mas parece não ter assistido ao filme (o que é mais provável), ou não entendido a cena ou ficado sem argumentos para responder ao que de fato é sugerido. Na publicação, afirma que seus carros "podem ser carregados a partir de painéis solares mesmo que o mundo vá mesmo para um cenário Mad Max e não exista mais gasolina" (tradução livre do post abaixo).
A cena não é sobre o fim da gasolina, como de fato aborda a saga Mad Max, que talvez tenha marcado a juventude de Musk. O cenário apocalíptico de O Mundo Depois de Nós se baseia em ciberataques nos sistemas de energia e comunicações. Uma das primeiras cenas do desenvolvimento do conflito é sobre um apagão em Nova York e, em seguida, some todo sinal de internet.
A ideia da cena dos Teslas é de que seria possível hackear o sistema dos carros autônomos para ajudar a disseminar o pânico ao isolar comunidades, o que seria um dos objetivos dos ataques, conforme especulação dos personagens. É uma referência a um episódio real: em 2022, um especialista em segurança de 19 anos conseguiu acessar o controle de 25 carros da marca de Musk a partir de um software produzido por um fornecedor chamado TeslaMate (saiba mais clicando aqui).
A coluna vai repetir um mantra: a ficção ajuda a projetar cenários alternativos também para nos preparar para o momento em que se tornem realidade sem alternativa. Foi assim com Oppenheimer, que aborda a bomba atômica para refletir sobre a inteligência artificial. É assim com O Mundo Depois de Nós.