Na segunda-feira, um time de bombeiros do governo federal saiu disparando extintores em espíritos esquentados com a aparente leniência com novas despesas provocadas por reajustes à cúpula do serviço público. Nesta terça, constatou-se que o alcance do esguicho é pequeno. O momento de não dar aumentos que vão pesar no orçamento já deficitário por mais de uma centena de bilhões não parece estar vinculado a cifras, mas a datas: deve ser evitado “pelo menos” antes da votação do impeachment.
A fase final do julgamento começa nesta quinta-feira, e não há sequer um aliado da presidente afastada Dilma Rousseff – nem ela mesma – que preveja um desfecho diferente da confirmação das votações maciças detectadas até agora. E como reconhecem adversários de Dilma – e alguns de seus apoiadores –, um dos principais motores do processo foi a crise econômica alimentada por decisões equivocadas, que fragilizaram as contas públicas. Então, o governo interino que está prestes a se tornar substituto definitivo brinca com fogo ao mostrar sinais de hesitação na mudança desse vetor. Até agora, só o que se viu foi o aumento da “meta” de déficit.
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Se conceder aumento para os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a União assistirá a um dominó de reajuste em sequência, daqueles capazes de desmontar outra tentativa de apagar incêndios, a renegociação da dívida dos Estados. A queda das peças será barulhenta e vai espalhar desordem financeira onde se esperava uma correção de rumos. Além de expor cada vez com mais clareza a divisão entre o time de operadores políticos de Temer e a equipe econômica, a brincadeira que sinaliza um avanço de duas casas seguido de recuo de três no jogo do reequilíbrio fiscal incuba outra fragilidade.
Um governo que tem tarefas duras pela frente – impor idade mínima para aposentadoria, rediscutir regras trabalhistas, empacotar um conjunto de privatizações e concessões – perde credibilidade ao dar com uma mão e retirar com a outra. Deveria valer a mesma regra para todos, certo? Não há dinheiro suficiente para tudo, então todos compartilham das renúncias em nome da recuperação do Brasil. Ou há recursos suficientes para atender aos públicos com maior “capacidade de interlocução” e para os demais.