Há quase um ano, Vladimir Putin esperava consumar a vitória sobre a Ucrânia em uma semana. Seus tanques esmagariam o desmotivado exército ucraniano, o governo liderado por um comediante seria deposto e um regime pró-russo se estabeleceria em Kiev sob o júbilo da população libertada. A Europa, temendo perder o gás e óleo russos, não sairia em defesa da Ucrânia.
Deu tudo errado para Putin. Nesta semana, suas tropas empregavam táticas da I Guerra Mundial no solo gelado da Ucrânia. Leva após leva, recrutas destreinados são despachados para a linha de frente nos arredores de Bakhmut. Sua missão é avançar alguns metros e despertar o fogo inimigo para que ele se torne alvo da artilharia russa. Quem titubeia ou desobedece, é executado. Metade das tropas é morta ou ferida em cada ataque, numa carnificina que não se via na Europa desde a guerra de trincheira.
Os pelotões da morte são compostos por apenados que receberam a promessa de perdão se passarem pelo menos seis meses no front. Cerca de 50 mil aceitaram a oferta e se juntaram ao grupo de mercenários Wagner. As estimativas são de que 30 mil já teriam morrido, 10% da população carcerária da Rússia. O trabalho do outrora poderoso exército russo, humilhado pela resistência ucraniana e a solidez do apoio ocidental, está sendo executado por bandos de presidiários.
Apesar dos vexames, e também por causa deles, não há perspectiva de fim da guerra, que pode se prolongar por anos como uma sequência de pequenos atritos até que o regime de Moscou seja derrubado por alguma insurreição de inconformados. Como essa hipótese é remota, restam outras duas:
- Vitória militar de um dos lados. É a opção menos realista. A Rússia ainda tem enorme poder de fogo e de mobilização, sem contar o arsenal nuclear. E uma rendição da Ucrânia representaria a rendição da Europa, o que é fora de cogitação diante da abertura de um precedente que relembra a antessala da II Guerra Mundial.
- Acordo de paz. Dificílimo, mas não impossível. Uma saída negociada poderia estabelecer uma zona desmilitarizada nas áreas ocupadas pela Rússia a ser administrada transitoriamente pela ONU. Mais adiante, essa área seria reincorporada à Ucrânia, que, em troca, abdicaria da adesão à Otan e assumiria o compromisso de respeitar os direitos das populações russas nos territórios.
O fim do inverno e a esperada ofensiva da primavera deverão delinear os próximos passos. Desde já, o que se vislumbra é uma escalada militar com a entrada em operação dos tanques Leopard cedidos por aliados europeus, em contraposição às novas forças regulares russas ainda em treinamento. Seja o que for, ninguém supunha, um ano depois da invasão, que a Europa teria se desviado da armadilha dos combustíveis russos e aprendido o significado da expressão Slavia Ukraini! (Glória à Ucrânia!).